ds_gen N. 6 – 2007 – Tradizione Romana

 

viegas-piccola.jpgcarlos henrique de souza viegas

Universidade Cândido Mendes – RJ

 

O Vocabulário e o Esboço de Teixeira de Freitas

 

«...yo después de um serio estudio de los trabajos del Señor Freitas,

los estimo solo comparables com los del Señor Savigny»

Vélez Sársfield

(Juicios Criticos sobre el Proyecto del Codigo civil , J.C. Texo, p. 245)

 

 

1. Introdução. – 2. A Filosofia Jurídica e Humanística de Teixeira de Freitas. – 3. Teixeira de Freitas Lexicógrafo - O estilema do Vocabulário e do Esboço. – 4. Teixeira de Freitas - Jurista de la América del Atlântico. – 5. Referências Bibliográficas.

 

 

1. – Introdução

 

O presente ensaio aborda a vida e a obra de Teixeira de Freitas, mais precisamente a sua monumental obra (mais do que a própria Consolidação) que é o Esboço. Essa denominação foi dada por Teixeira de Freitas ao projeto por ele elaborado para o Código Civil brasileiro. Esboço que, na proclamação de Clovis Bevilacqua entrou para o acervo da jurisprudência pátria como a sua contribuição mais valiosa, pela riqueza, segurança e originalidade das idéias.

O Esboço se foi publicando em tomos ou fascículos. Nada menos do que 3.702 artigos chegaram a ser publicados e, quando a obra foi interrompida, mais 1.314 já se encontravam no prelo, além de mais duzentos que, em manuscritos, estavam quase concluídos sobre os jura in re aliena direitos reais em coisa alheia. Teixeira de Freitas só não chegou a elaborar o livro referente aos direitos em geral, mais precisamente o referente a sucessões, concurso de credores e prescrição.

De suas idéias originais, ao menos sob a óptica do direito positivo brasileiro, tem-se, entre outras, a unificação do direito privado e a referente à classificação das matérias do Código, como, aliás, claramente expôs na citada introdução à Consolidação: «Os direitos civis são direitos pessoais ou direitos reais, havendo, contudo, institutos de natureza comum, que envolvem direitos reais e pessoais, como a herança, o concurso de credores e a prescrição».

Muitos dispositivos do Esboço, observe-se, por outro lado, subsistem no Código Civil de 1916. Todavia, o mais impressionante é a sua influência em outros países latino-americanos como a Argentina, o Uruguai e o Paraguai. O Código argentino não só reproduziu seus inúmeros artigos como seguiu-lhe a orientação geral. No Código Civil do Uruguai é considerável a sua influência e, no do Paraguai quando da adoção (como lei sua) do código argentino.

 

 

2. – A Filosofia Jurídica e Humanística de Teixeira de Freitas

 

Teixeira de Freitas não foi, e nem tampouco se reconhecia como filósofo do Direito. Invocava para si o justo título de romanista e civilista, em coro com José da Silva Lisboa, o Visconde de Cairú, ao dizer da Roma americana «não podeis fazer-me maior honra do que chamando-me   de romanista».

Há poucas, porém boas biografias sobre Teixeira de Freitas, as mais antigas são as de Sá Vianna e Spencer Vampré, as mais modernas são de Haroldo Valladão, e do ponto de vista historiográfico, a mais completa é a do romanista paraense Sílvio de Bastos Meira (Teixeira de Freitas - O Jurisconsulto do Império, 1979, Rio de Janeiro, Liv. e Editora José Olympio [Coleção Documentos Brasileiros, vol. 185]), obra de referência obrigatória para o Freitismo, cujo nome está a reclamar até hoje a edição das suas obras completas!

Savigny o inspirara, a quem Teixeira de Freitas simplesmente chamava de “o jurisconsulto”, ainda que o mestre da Escola Histórica privilegiasse o direito costumeiro e a Volksgeist (fenômeno da Kulturkampf do século XIX, cujo expoente maior é Goethe, ao lado do seu correlato Hegel).

A correlação com a Escola Histórica, que sob certos aspectos foi aprofundada por Hegel, dá-se em razão do “naturalismo contingente” ou o que mais tarde Rodolfo Stammler veio a chamar de «direito natural de conteúdo variável», o conjunto de princípios normativos e orientadores de regras jurídicas espaço-temporais em função do evolver histórico das instituições.

A vinculação de Teixeira de Freitas ao autor do System des heutingen römischen Rechts (Sistema de Direito romano hodierno) pode ser inferida não só pela explícita adesão do autor às idéias do defensor do historicismo na Alemanha (contra Thibaut) como também pelo seu realismo histórico-social expresso no Esboço.

A aporia da oposição de Savigny contra a codificação contrasta com a de Freitas, uma vez que caracterizou-se pela oposição às doutrinas jusnaturalistas dos séculos XVII e XVIII, em que afirmavam a existência de um direito natural universalmente válido, cuja essência e fundamento estariam na própria natureza do homem, daí derivando uma série de direitos subjetivos e inatos, os quais não poderiam ser desconhecidos ou conspurcados por qualquer poder. Rompendo com as concepções teológicas medievais acerca do Direito e do Estado, buscano exprimir, sob o aspecto ideológico, a luta progressiva da burguesia em ascensão, e do ponto de vista religioso, a consolidação do cisma reformista, que já não podia basear-se na fé para a consecução de um direito comum, mas sim num sistema que se baseasse na natureza e na razão humana.

O jus naturale assim concebido visava o aniquilamento do direito feudal, bem como à criação de novas relações sociais e de uma organização política adaptada aos seus interesses da classe burguesa. O direito positivo ou histórico não poderia servir de ponto de apoio às aspirações referidas, pois representava a ordem existente, o poder do Estado feudal. Daí a necessidade de uma ideologia diferente, que se consubstanciou na teoria do direito natural racional que justificasse a nova fé e o capitalismo.

Cumpre, à guisa de ilustração, relacionar os pontos comuns a todas as Escolas do direito que se viram influenciadas pelo jusnaturalismo clássico: 1.°) O Direito teria como fundamento, contrariamente às concepções teológicas feudais, não uma lei divina ou a vontade de Deus, mas sim a própria natureza do homem, podendo ser descoberto pela razão; 2.°) O homem teria vivido, primitivamente, em um estado de natureza, uma Idade de ouro como a dos antigos estóicos segundo alguns ou um estado de luta segundo outros, passando depois, através de um pacto ou contrato social, para o estado civil, quando então transferira à sociedade uma parte dos seus direitos, para que ela, em troca, defendesse a sua vida e propriedades; 3.°) Derivando o direito da própria natureza do homem, possuiria este direitos naturais, originários e inalienáveis, os quais não poderiam ser ignorados ou diminuídos por qualquer poder, já que eram anteriores a toda sociedade; 4.°) Podendo o direito natural ser conhecido por meio da razão, estaria o legislador capacitado a elaborar sistemas jurídicos perfeitos, devendo ser, portanto, estimulada a atividade legislativa.

A idéia de que o fundamento último do direito natural seria a própria natureza do homem racional dava a todas as doutrinas do jusnaturalismo clássico um sentido anti-histórico, pois as relações jurídicas, bem como o Estado, eram consideradas fenômenos eternos e imutáveis, independentes da evolução histórica. O individualismo estava igualmente implícito nessas teorias, pois tomavam elas como ponto de partida o homem isolado, fora da existência da sociedade. Variavam ainda as diferentes doutrinas no tocante à garantia última de aplicação do direito natural.

Nos Estados Unidos foi James Wilson o representante mais destacado da filosofia jusnaturalista, partilhando das suas idéias vários dos autores da Constituição de 1787. Na França, em seguida aos enciclopedistas e demais ideólogos da Revolução Francesa, a teoria jurídico-natural e do contratualismo alcançou a sua culminância e, também, o seu sentido mais radical, com a figura de Jean Jacques Rousseau. Suas idéias exerceram notável influência sobre Immanuel Kant, o grande representante do racionalismo alemão. A escola clássica do direito Natural teve, entre outras conseqüências importantes, tais como o movimento em favor das atividades legislativas, a criação dos instrumentos jurídicos que permitiram a superação das restrições feudais, a humanização do Direito Penal e de seus processos, aquela de haver estabelecido os direitos e liberdades fundamentais da pessoa humana, consubstanciados na Déclaration des droits de l’homme et du citoyen de 1789.

A falácia da escola jusnaturalista clássica, que buscava os fundamentos éticos do direito de uma sociedade secularizada pluralista numa razão comum parte do falso pressuposto de um conceito de natureza em que ela mesma e a razão são entrosadas de tal modo que a própria natureza se torna racional, essa visão as natureza perdeu a sua razão de ser com o advento da teoria da evolução. A natureza em si não é mais vista como racional, ainda que exista nela um comportamento racional.

Mais tarde a própria escola-histórica, pela mão de Giambattista Vico, combatente dos pressupostos racionais da escola clássica do Direito Natural, homem que afirmava existir uma Providência ou inteligência imanente do mundo, que criara as leis da História. Contemporaneamente a Vico, Montesquieu procurava ressaltar a influência da tradição, ao lado dos fatores geográficos, na história de cada povo. E o mesmo fizeram os pré-românticos alemães Justus Mõser e Johann Gottfried Herder. Porém, os verdadeiros inspiradores da Escola Histórica foram os escritores adversários da Revolução Francesa, como Burke, Joseph de Maistre, Gabriel de Bonald, Adam Müller, von Haller, Vincenzo Cuoco e outros, os quais repeliam as doutrinas jusnaturalistas, sustentando serem o direito e as instituições políticas fruto da história e da tradição de cada povo e não o resultado de princípios racionais. Como iniciador da escola deve ser mencionado o nome de Gustav Hugo, professor em Göttingen. Foi, porém, com Friedrich Karl von Savigny e seu discípulo e sucessor na cátedra em Berlim, Georg Friedrich Puchta, que o historicismo jurídico não apenas ganhou realce como formulou de maneira sistemática os seus postulados básicos, assim resumidos: 1º) O direito surge da consciência nacional ou espírito do povo, isto é, das convicções próprias da comunidade, mantidas pela tradição; 2º) O direito evolui espontaneamente, tal como a linguagem, não podendo ser imposto em nome de princípios racionais e abstratos; 3º) O costume é a principal fonte do Direito, cabendo ao legislador ser o intérprete das regras consuetudinárias, transformando-as em leis.

Aos nomes acima referidos podem ser acrescentados os de outros juristas alemães do século XIX, como Johann Friedrich Göschen e Kari Friedrich Eichhorn, bem assim os de historiadores e eruditos, como Barthold Niebuhr e Jakob Ludwig Karl Grimm. Cabe, também, mencionar o historicismo jurídico de caráter religioso, do qual foram as expressões maiores Friedrich Julius Stahl entre os protestantes e George Philips entre os católicos, orientação que assumiu aspecto extremadamente conservador, identificando-se em muitos pontos com a dos escritores contra-revolucionários da Restauração.

Neste breve perfil da escola histórica, vê-se que a vinculação de Teixeira de Freitas não se coadunava plenamente com ela, ademais do Krausismo que lhe permeia toda a obra de Direito Positivo (vide a Introdução ao Esboço), há mesmo que se considerar a renovação da romanística pela mão do pandectismo alemão, e Freitas mostou-se um metódico e sistemático estudioso do direito civil em muito semelhante, mas originalmente diferente.

O Pandectismo repelia as teorias jusnaturalistas, bem como qualquer noção absoluta ou abstrata da idéia do direito, considerava este como um corpo de normas positivas a serem estabelecidas com base no sistema “científico” do direito romano, apresentava pontos de identidade com a escola francesa da exegese, desenvolvida na mesma época. Entretanto, ao passo que os juristas franceses tomavam como ponto de partida a lei positiva, consubstanciada nos códigos promulgados sob Napoleão, os pandectistas, ante a inexistência na Alemanha de uma legislação semelhante, procuravam, inspirando-se nos estudos romanísticos da escola histórica do direito, construir um sistema dogmático de normas, usando como modelo as instituições romanas.

No que tange ao ideal de codificação, a influência maior que certamente inspirou o espírito de Freitas na preparação do seu ciclópico Esboço foi a da escola exegética, surgida na França, durante o século XIX, durante o período de Napoleão. A codificação napoleônica abrangera não apenas o famoso Código Civil dos franceses, promulgado em 1804, mas também o Código de Processo Civil (1806), o Código de Comércio (1807), o Código de Instrução Criminal (1808) e o Código Penal (1810), tendo por objetívo a unidade legislativa de toda a França, objetivo esse que o Brasil também almejava.

O Code Civil, bem como os demais códigos e leis que se lhe seguiram, constituíam o fundamento normativo da nova ordem estabelecida pela revolução burguesa de 1789. A elaboração do Código Civil fora mesmo um dos primeiros objetivos da Revolução, tendo sido ordenada pela Cons­tituição de 1791. Como consequência do seu apego à letra da lei e à sua interpretação, ou, para complementar a tarefa exegética, à pesquisa da vontade ou intenção do legislador, negava a Escola da Exegese qualquer valor aos costumes jurídicos e à atívidade criadora da jurisprudência. Apesar da forçada imobilidade a que submeteu o direito francês, divorciando-o da realidade social, perdurou durante grande parte do século XIX e sua influência se faz sentir ainda hoje. Dos seus principais representantes podem, entre outros ser mencionados os nomes do alemão Karl Salomon Zachariae, Jean Charles Demolombe, Raymond Troplong, François Launenty Victor Napoléon Marcadé, Charles Antoine Aubry, Charles Rau e Gabriel Baudry-Lacantinerie, notadamente os três últimos, autores de famosos tratados sobre o direito civil francês.

A identidade de Freitas com a escola histórica dá-se pela ignorância das causas fundamentais do direito em detrimento das convicções morais do Volksgeist. Vislumbra-se na sua concepção do direito a confluência das idéias hauridas na obra de Savigny, como nos do praxismo português, baseado na subsunção do caso à lei, a par da experiência jurídica popular, isto é, a latere das suas peculiares circunstâncias históricas e sociais, em vez do “espírito do povo”, prefere ele aludir, mais concretamente, ao liame que une o direito positivo «ao gênio particular dos diferentes povos», segundo «o estado mais ou menos avançado da civilização, e sobretudo a forma de organização política e social» (Código Civil Esboço – introdução, Rio de janeiro, Ministério da Justiça, 1952).

O sentir social de Teixeira de Freitas parece haver sido influenciado pelo Krausismo, muito em voga na Alemanha na segunda metade do século XIX, ideologicamente vinculado às revoluções liberais daquele tempo, cujos expoentes são Ahrens na Bélgica e “Los dos Ríos (Julian e Giner) na Espanha. Para Friedrich Krause, o idealismo do direito natural estava condicionado à realidade social, numa espécie de panenteísmo em que combinavam as filosofias de Kant, Fichte, Schelling e Hegel com o jusnaturalismo pandectista de então. Para o filósofo de Heildelberg a lei natural e a idéia do justo preexistentes a priori no homem individual, realizam-se a posteriori no homem social.

A socialidade do direito de raiz jusnaturalista, contraposta à subjetividade transcendental Kantiana, realça a consciência da função social do direito dos adeptos do panenteísmo ao filósofo de Königsberg, autor da forma a priori e universal do comportamento humano.

Para Freitas, o valor fundante do ordenamento jurídico é a pessoa humana, na diretriz da filosofia Krausista, mormente dos Krausistas espanhóis, ou seja, como um ente ao mesmo tempo individual e social, consoante a aspiração de Krause de superar “o individualismo” de Kant, ao conceber o homem integrado nas suas relações sociais, basta lembrar a sua ojeriza à escravidão e a sua preocupação com a situação dos estrangeiros.

O homem em Teixeira de Freitas é o Absoluto participado horizontalmente, já que o homem se define e se realiza culturalmente em sociedade e verticalmente, quando esgotada a sua contingente finitude, busca a permanência no valor absoluto definitivo (eterno) de Deus, valendo-me aqui de uma interpretação teocêntrica do homem como ser teomorfo, em que o valor absoluto horizontal e vertical realizam o homem integral.

A pessoa humana é o ponto fulcral da filosofia do direito de Teixeira de Freitas, e será desta concepção que ele construirá, num mimetismo germânico, a divisão entre direitos reais e pessoais como absolutos e relativos, a serem comentados mais adiante. O humanismo de Freitas aproxima-se do culturalismo realeano, da dimensão integral do homem de per si e da sua dimensão social do ser-para-o-outro.

O aparente Kantismo de Freitas em seu jusnaturalismo apriorístico não esgota o seu pensamento social, convencido estava de que uma lei legitimava-se na legalidade, quando expressava, de maneira inequívoca, as mais altas aspirações do homem na caminhada do ser (sein) para o dever-ser (sollen).

A sólida formação humanística e jurídica de Teixeira de Freitas, não o enganava em relação à complexidade do fenômeno humano, tomado aqui pela sua perspectiva social e jusculturalista, a abranger variegados fenômenos v.g. naturais, culturais, sociais, políticos e econômicos, informadores desta perspectiva social, e portanto do fato social, bem como da perspectiva jurídica desta sociedade, e portanto, do fato jurídico, em que ambos, fato social e fato jurídico, por interagirem plenamente nas relações humanas, são capazes de construir o sistema jurídico, heterônomo e autopoiético, de modo a legitimar o modelo paradigmático (e hermenêutico) do direito por ela plasmado, o que pode explicar a determinação de Teixeira de Freitas para o Código Geral, capaz de todo o direito privado, entretanto, ele não houvera atinado para a hermeticidade do modelo privatístico do séc. XIX, totalmente fechado, que o levou a escrever mais de 4.000 artigos!

Pois é dessa consciência do fato social que Teixeira de Freitas, em oposição à legislação brasileira vigente desde 1850 do princípio da lei do nacional, o jus sanguinis tradicional nos países do velho continente, interessados em manter seus filhos ligados à pátria, através dos seus costumes e da aplicação do seu direito.

O Esboço consagrava o princí­pio da lei do domicílio, a lex domicilii et solis, universalista, congregadora de todas as raças e todos os povos, a civitas augencens do velho Pompônio, a civitas amplianda, o amor ao estrangeiro e sua incorporação no seio da sociedade na qual ele escolheu para viver, ao revés do Brasil, a lei do domicílio foi logo adotada na Argentina e em outros países do continente, entre nós, somente com o advento da nova lei de introdução ao código civil de 1942, por circunstãncias temporais (os cidadãos dos países do Eixo eram parcela expressiva da imigração brasileira) é que consagrou-se definitivamente em nosso sistema o princípio do domicílio.

Vale dizer que o ilustre codificador argentino Dalmácio Véiez Sarsfield, autor do projeto do Código Civil Argentino, seguiu, em boa parte, as diretrizes do Esboço em relação ao domicílio, já que o seu art. 53 corresponde ao art. 32 do Esboço, aliás, elogiada por Carlos Cossio na sua Teoria Egologica del Derecho (1964, pág. 405) como possuidora de um conteúdo jurídico a priori, fundado direitamente na intuição da liberdade de conduta, além dos famosos dispositivos relativos à pessoa natural e jurídica. A demonstrar a sua dissonância com Savigny no que se refere à natureza das pessoas jurídicas, não adota a Teoria da Ficção, mas as pessoas de existência ideal, vale dizer, entidades ou entes jurídicos distintos das «pessoas de existência visível», ou seja, todos os «entes que apresentarem característicos da humanidade», preferiu o seu Vocabulário em vez de exercícios imaginativos, os «entes de existência ideal», antecipam, a bem de ver, a «teoria dos objetos», o que lhe valeu os encômios de Vélez Sarsfield, nas suas notas integrantes dos artigos 31 e 55 do Código Civil portenho (as notas ao Código são legalmente parte integrante do mesmo), em epístola datada de 20 de junho de 1866 dizia ele «toda a dedicação da minha vida encerra-se no Projeto e não há consideração que eu anteponha à verdade»[1].

A visão institucional do Estado foi sempre a de resgatar o sentido social das instituições políticas, v.g. o passo em que comenta o projeto de Código Civil dos Países Baixos- «o sistema inteiro de um Código depende muitas vezes de uma só disposição» (Código Civil Esboço – introdução, Rio de janeiro, Ministério da Justiça, 1952), e «Cada relação de direito tem a sua sede própria, seu lugar de existência» (Código Civil Esboço – introdução, Rio de janeiro, Ministério da Justiça, 1952) e a sua irresignação contra aqueles que não levavam em conta o Estado, «imbuídos nos princípios de um falso Direito Natural».

 

 

3. – Teixeira de Freitas Lexicógrafo - O estilema do Vocabulário e do Esboço

 

O Vocabulário, mais até do que o Esboço, é a obra que melhor retrata a carga semântica das palavras, quando sintaticamente ordenadas por Teixeira no posterior Esboço, é nele que vamos nos dar conta do estilema[2] da autor pela expressividade com que conceituava os sintagmas, aliada à abonação, sempre clássica e por vezes curiosa, com que arrematava os verbetes.

Eis alguns exemplos que colacionamos:

 

Ano: É o lugar cronológico do escoamento do tempo, como ânus é o da repetida passagem dos nossos escoamentos grossos.

Ano exprime os 365 graus dos círculos, salvos os sobejos sucessivamente corrigidos.

Esta soma de graus (gera os) foi preferida, por ser divisível em muitas partes alíquotas, isto é, sem ficar fração.

Em verdade, sua metade vem a ser 180 graus, seu terço 120, seu quarto 90, seu quinto 72, seu sexto 60, seu oitavo 45, seu nono 40, e seu décimo 56.

Note-se bem, com muita atenção, que não tem sétimo com partes alíquotas; e daí a criação do Cap. I do Génesis em 6 dias, compostos de tardes e manhãs, e portanto começando à meia-noite.

SETE - 7 - pois, é a unidade do SENHOR DEUS (sé tem), de que ele começou a consertar; fazendo a primitiva Páscoa, e obrigando assim o Deus Diabo a parar ou descansar.

 

Dia é o espaço de tempo, pelo qual se medem as semanas, os meses, e os anos, do tempo imóvel do calendário; tendo este entre nós a denominação vulgar de folhinha, que herdamos de Portugal, uma das muitas indicações do futuro destino da língua portuguesa neste Império do Brasil. Eis a tal respeito o conteúdo dos nossos dois lexicógrafos nos dicionários, que tomamos por base do nosso Vocabulário.

 

Dignidades são distinções, merecimentos, qualidades honoríficas, que enobrecem os estados dos homens, quando bem merecidas; porquanto as distinções públicas não se instituirão para os homens como tais, mas só para recompensa de seus méritos verdadeiros. Infelizmente acontece quase sempre o contrário!

 

Dinheiro é a coisa única do mundo, que representa todas as outras, que são suscetíveis de valor pecuniário: e daí o provérbio falso pela sua generalidade: quem dinheiro tiver, fará o que quiser.

Só DEUS pelo direito — um só Deus verdadeiro — a tudo representa diretamente, ou indiretamente, a começar da Santíssima Trindade.

Pelo seu fim de representação comum, são importantíssimos os efeitos jurídicos da invenção do dinheiro manifestando-se em quase todos os assuntos.

 

Direito, se Deus a tudo representa subjetivamente, o representa objetivamente, pois que o mundo só pode existir juridicamente; e, ao contrário, só a Misericórdia Divina nos pode salvar. Direito tem duas significações notáveis; uma de faculdade concedida a cada um de nós para exigirmos o necessário a nossa coexistência.

 

Equidade, não há palavra de que mais se use, e todavia nenhum escritor satisfaz sobre o seu verdadeiro sentido.

Segundo a Doutrina do Dic. de Pereira e Sousa:

“Equidade, no sentido primitivo e verdadeiro, é o mesmo que justiça (não concordo), são palavras sinónimas', entendendo-se por ambas a disposição de ânimo constante, e eficaz, de tratar qualquer ente, como ele é; e de contribuirmos, quanto está em nós, sem prejudicar-nos, nem prejudicarmos a outros, para o fazermos perfeito e feliz.

“Alguns moralistas confundem a equidade com a caridade, dizendo querela consiste em não exigir com rigor o que nos é devido, e em relaxar voluntariamente alguma parte dos nossos direitos reais.

“Às vezes a lei positiva se opõe à equidade natural, mas isto provém do defeito da lei, que não pode prever e acautelar todos os casos; sendo certo que uma lei justa em um caso pode vir a ser injusta em outro, o que é uma consequência dos limites do espírito humano.

“Neste sentido é que os jurisconsultos se servem da palavra equidade, para aporem à ideia da palavra lei, querendo significar que a justiça se exerce antes, não segundo o rigor da lei, mas com moderação e modificação racionável.

“A equidade, que vulgarmente se chama equidade de Bârtolo, e que teve lugar na sucessão dos prazos vitalícios, e no direito da renovação deles, não foi inventada por Bârtolo; mas estabelecida em direito natural, que não consente que alguém tire lucro da perda alheia — Lei de 9 de setembro de 1770, § 9.”

De acordo com a Doutrina do Dic. de Ferreira Borges:

“Esta palavra tem em jurisprudência duas significações. Na primeira significação, pode tornar-se por aquele ponto de exatidão que determina a decisão de um juiz, quando quer seguir as regras estritas, a que é obrigado.

“Na segunda significação, vem de que a justiça é exercida, não segundo as regras da lei, mas moderada e adoçada razoavelmente.

“A lei sem equidade é nada. Os que não vêem o que é justo ou injusto senão através da lei, nunca se entendem tão bem, como os que o vêem pêlos olhos da equidade.

“O estudo dos princípios da equidade é o estudo por excelência do magistrado, e do jurisconsulto; e neste estudo bebam as luzes da sabedoria, que devem caracterizá-los.

“Em nenhum ramo de jurisprudência brilha mais a equidade que nas leis comerciais, desde as primeiras, que nos deixou a Antiguidade. Quem bem as estudar, e combinar os princípios dessas determinações, e sua sanção, achará que merecem o nome de equidade escrita. Todas as ordenanças comerciais, que se apartam do rigor do direito civil, não são senão a moderação e mitigação razoável deste outro direito.

“Daí vem que não há máxima comercial que não tenha por base a suma equidade; e aconselhará e julgará mal, em discussões do comércio, quem não olhar para a lei pêlos olhos da equidade”.

Na Doutrina do "Repertório de Jurisprudência", de Merlin:

“É bem certo, que aqueles que fazem profundo estudo do direito e da equidade têm noções mais finas, mais delicadas, do justo e do injusto. Pode-se mesmo dizer que a lei seria inútil aos homens, se cada indivíduo tivesse, no coração, o amor da equidade, se cada cidadão se pudesse instruir por si mesmo em seus deveres. Ora, neste sentido, a equidade faria tudo sem a lei.

"Mas, o que vem a ser a equidade na opinião da maior parte dos homens? Ê muitas vezes (atenção!) alguma coisa de tão arbitrário, que o justo para um é o injusto para outro; a equidade, entretanto, como a verdade, só é uma. Não é pois exato dizer que aequidade é tudo sem a lei, visto que sem esta ficaria obscuríssi-ma; assim como também, o que sem a equidade ficaria sendo a lei?

“Hoje os juizes não podem mais suprir as penas que a lei não pronuncia, nem agravá-las, ou mitigá-las (o mesmo pelo nosso direito segundo o art. 33 do Cód. Crim.).

“Em matérias civis (atenção!), em que a lei é clara, e precisa para certos casos, seria ferir a própria equidade fugir da lei, a pretexto de temperar, ou melhorar suas disposições com uma equidade maior, etc.”.

Só achamos generalidades nas proposições dos nossos dois primeiros lexicógrafos, algumas sem exatidão, e portanto não aceitáveis até certo ponto; mas, no Repertório de Merlin, tais proposições mostram-se até opostas entre si, sem deixarem alguma noção segura.

Se a eqüidade fosse o mesmo que a justiça, exprimindo palavras sinônimas, como diz Pereira e Sousa por imitação de Merlin, a nossa Constituição política não mandaria em seu art. 179, XVIII, organizar quanto antes um CÓDIGO CIVIL E CRIMINAL, fundado nas sólidas bases da JUSTIÇA E EQUIDADE. Logo, aí temos idéias distintas.

E, quanto à eqüidade ser temperamento ou moderação de justiça, vemos esta censura do Dic. de Moraes no Ensaio de sinônimos, de Frei Francisco de S. Luiz[3].

A boa razão, pela qual o § 9.° da Lei de 18 de agosto de 1769 autoriza a julgar, pode ser a razão absoluta da equidade; e daí não se segue também, que autoriza a julgar contra as disposições das nossas leis positivas. Ao contrário, proíbe que assim se julgue, e até contra os usos legitimamente aprovados; e só autoriza a boa razão relativamente ao direito romano, quando o direito pátrio for omisso sobre os casos ocorrentes.

A JUSTIÇA é um sentimento do coração humano, é uma virtude, é (como sabiamente ensina o direito romano) uma constante e perpétua vontade de dar a cada um o que é seu; mas conforme à lei aplicável, qualquer que seja esta. A equidade pode referir-se ao tempo de uma lei futura, que pode cada um desde já imitar, se o direito atual não lho proíbe.

O achaque da Presente Existência é atribuir-se-lhe um sistema imutável, com esquecimento do Pecado Original, sob cujos males, e nas garras da Morte, irmos imperfeitamente vivendo. Tal estado carece do bem em todas as suas manifestações possíveis, e portanto não tem justiça. A Presente Existência tem por fim, para que DEUS seja realidade, trocar uma existência imperfeita e defeituosa por outra final, que seja perfeita em todas as aspira­ções morais. Nosso futuro destino, portanto, é a Existência Uni' versai, o Universo, o Céu na Terra; e tal será o último estado da justiça, em que as leis, que são as letras do nosso A, B, C, em equação com ela, representarão um novo Deus a final.

A esse último estado antecederá o da equidade, obra do homem justo, como precursor da existência universal, obra que alguns teólogos da filosofia escolástica (veja-se o Vocabulário de Bluteau) têm chamado CIÊNCIA MÉDIA.

 

Homem, na interpretação das leis, deve-se entender homem e sua mulher, como um só ente, salvo quando expressamente forem considerados um ente separado.

A Ord., Liv. 1.°, Tít. 31, § 1.°, e a do Tít. 84, § 3.°, declara o marido e sua mulher como um só corpo; e o doutíssimo Savigny cada um deles, como entes por metade.

Se, na doutrina cristã, o celibato dos santos se reputa estado mais perfeito que o do matrimónio, percebe-se nisto, hoje, uma necessidade provisória por motivo da Futura Ressurreição da Carne, prometida no final do Símbolo dos Apóstolos, em modelo microscópico de uma sociedade perfeita.

A tal respeito o Dic. de Pereira e Sousa apenas limitou-se a estas considerações[4].

 

Jurisconsulto (Pereira e Sousa) é o que sabe as leis, as interpreta, aplica o direito aos casos; e responde às espécies, a que as leis são aplicáveis.

Jurisconsulto (Ferreira Borges) é o versado na ciência das leis, que faz profissão do direito, e de aconselhar.

Os antigos davam a seus jurisconsultos os nomes de sábios e filósofos, porque a filosofia encerra os princípios das leis e seu objeto é impedir a violação das leis.

Os jurisconsultos romanos eram o que chamamos hoje advoga­dos consultantes, isto é, aqueles que, pelo progresso das idades, e pelo mérito científico, chegavam ao emprego das consultas, com a denominação de advocati conciliam, diferentes dos júris-peritos.

Basta, para ser autor em jurisprudência, fazer um livro sobre leis, bem longe porém de que lhe confira ele a qualificação de jurisconsulto. Que é pois, o jurisconsulto senão o homem raro, dotado de uma razão forte, de uma sagacidade pouco comum.

 

Jurisprudência (direito romano) é a notícia das coisas divinas e humanas, ciência do justo e injusto.

 

Igualdade quer dizer semelhança de circunstâncias.

A igualdade natural é a base de todos os deveres sociais, sendo, como diz Sêneca, o fundamento da equidade.

Os homens são iguais entre si, pois a natureza humana é a mesma em todos; tendo todos a mesma razão, as mesmas faculdades e um só e único fim.

São naturalmente independentes uns dos outros, posto que de­pendam igualmente de DEUS, e das leis naturais. Têm o mesmo tronco ou origem, seus corpos são compostos da mesma matéria; ricos e pobres, nascem, crescem, instruem-se, conservam-se da mesma maneira, morrem enfim e seus corpos igualmente se corrompem e se reduzem a pó. São sensíveis estas verdades a todos, porém não se segue delas, que deva reinar entre os homens uma igualdade de fato, mas só a igualdade de direito, que não permite fazer a outrem o que não queremos que se nos faça a nós; e que deve dispor-nos a fazer em favor dos outros as mesmas coisas que queremos que eles façam a favor nosso.

Esta igualdade consiste somente no direito, que todos os homens têm igualmente à sociedade e à felicidade, de sorte que todo o homem tem direito a que os mais o tratem como homem, que não se lhe faça alguma injúria, e que não se quebrante a seu respeito a lei natural.

O estado de solidão, de independência e de igualdade absoluta, é inteiramente incompatível com as precisões dos homens.

É necessário que eles vivam em sociedade para serem felizes, e não podem nela viver sem graus de relação, e de dependência entre si.

Estes graus de dependência foram estabelecidos por utilidade comum dos que servem e dos que mandam.

Todos devem contribuir para o bem público, os superiores por via de autoridade e de inspeção, e os inferiores por via de respeito e de submissão.

Os diversos graus de subordinação dependem necessariamente de um Poder Supremo que governa a todos os cidadãos.

 

Império (Dic. de Moraes) vêm a ser os direitos de que goza o Imperante, ou Soberano.

Distingue-se em império mero, mero império e império misto.

Império mero é o poderio absoluto do soberano sobre seus vassalos, com direito de os punir, tirando a honra, a vida, e os bens.

Mero império é a jurisdição que o soberano dá aos magistrados para julgar as controvérsias, e impor a pena de morte, confiscação de bens, etc.

Império misto é o poder de julgar causas cíveis, e de impor penas pecuniárias; e, entre as aflitivas corporais, a prisão, e outras, que não sejam de sangue — Ord. Afonsina, Liv. 2.°, Tít. 63 „ § 2.°.Império.

Esta distinção é importantíssima, indicando que o IMPÉRIO exprime um só homem, só a educar-se na escola do mundo até que sua instrução obtenha certo grau, que o DIVINO REDENTOR o julgue digno de ser escolhido para Paracleto, para Evo; e assim o confirmam nossos costumes, e a decomposição da palavra.

 

Alguns conceitos expendidos por Teixeira de Freitas naquela que seria a sua última obra o Vocabulário Jurídico, foram escolhidos tendo em conta a originalidade das abonações ou a sua importância para a fixação dos sentimentos jurídicos do autor[5], valeu-se, designadamente da doutrina do Diccionário de Pereira e Sousa, como o seu conceito de eqüidade...[6].

Tinha Freitas a noção exata de que o direito está a serviço de um ideal e este ideal é o ideal de justiça, que lhe foi tão caro e que lhe faltaram tantas vezes. Porém sem desacreditar deste ideal, pode ter desanimado diversas vezes, e possivelmente desanimou, frente ao que os seus inimigos, invejosos da sua competência e capacidade de trabalho, lhe aprontaram até o final do vida, mesmo o causídico de Mecejana, José de Alencar, morto aos 48 anos, não desistiu de perseguir um velho Jurista, já sem saúde, porém já exalando o odor de imortalidade que a sua genuína obra deixaria, odor este que incomodava a muitos.

 

 

4. – Teixeira de Freitas - Jurista de la América del Atlântico

 

Preliminarmente mister se faz citar que Teixeira de Freitas foi um renomado jurista, teve reconhecimento na América Latina e fora dela, foi o jurista do Atlântico, ao lado de Andrés Bello, jurista do Pacífico.

Cabe ainda elucidar que o Código Civil, previsto na Constituição brasileira de 1824 (art. 179, XVIII), como se sabe, demorou muito a ser aprovado, até porque não é nada fácil a feitura de um código disciplinador dos direitos e obrigações de ordem privada concernentes às pessoas, aos bens e às suas relações. Assim, até à entrada em vigor da obra de gênio de Clovis Beviláqua vigiram as Ordenações Filipinas, mais precisamente o seu Livro Quarto.

Evidentemente que as citadas Ordenações, que entraram em vigor em 1603, resistiram até o Século XX com muitas renovações, como a Lei da Boa Razão (1769), ao tempo de Pombal (como sabido, a lei em destaque dispôs sobre a observância das glosas do Chanceler da Casa de Suplicação de Lisboa, sobre a interpretação das leis tanto pela citada Casa quanto pelas Relações, bem como sobre a aplicação do direito subsidiário, em particular o Romano, e dos estilos e costumes) e a Consolidação das Leis Civis (Aviso de 24 de dezembro de 1858), monumental obra de Augusto Teixeira de Freitas.

Consabido que, de par com as Ordenações em destaque, numerosíssimas leis avulsas se foram acumulando e era preciso ordená-las sistematicamente, inclusive atualizando o Código Filipino. Essa enorme tarefa coube a Teixeira de Freitas, que, no prazo de três anos, consolidou, em 1.333 artigos, acompanhados de preciosas anotações e precedidas de uma introdução (simplesmente extraordinária), toda a legislação civil no direito brasileiro.

Com a promulgação do primeiro Código Civil português em 1867, as Ordenações Filipinas perduraram apenas no Brasil. Esclareça-se, de outra parte, que Teixeira de Freitas excluiu da Consolidação qualquer disposição referente à escravidão. Nada de estranhável para um jurista do seu porte, de sua sensibilidade e coerência, até porque para ele «a liberdade é o homem. A liberdade em política jamais teria o nome de direito se os povos se houvessem reunido das instituições opressivas; e na vida civil não teria correlativo, se não fora o abuso da escravidão».

Obra, contudo, a merecer adjetivação de monumental (mais do que a própria Consolidação) é o Esboço, como Teixeira de Freitas denominou o projeto por ele elaborado para o Código Civil brasileiro. Esboço que, na proclamação de Clovis «‘entrou para o acervo da jurisprudência pátria como a sua contribuição mais valiosa, pela riqueza, segurança e originalidade das idéias». 

A unificação do direito privado e a referente à classificação das matérias do Código, exposta na citada introdução à Consolidação: «Os direitos civis são direitos pessoais ou direitos reais, havendo, contudo, institutos de natureza comum, que envolvem direitos reais e pessoais, como a herança, o concurso de credores e a prescrição». À crítica de não se tratarem de idéias efetivamente originais, tenha-se a observação do jurista argentino Martinez Paz (que escreveu uma biografia de Teixeira de Freitas e traduziu para o castelhano a introdução da Consolidação) que, após lembrar que o notável jurista não pretendia que sua classificação fosse absolutamente original, «sin dejar de ser antiguo, infundió a sus pensamientos un grave sentido de modernidad».

Muitos dispositivos do Esboço, observe-se, por outro lado, subsistem no Código Civil de 1916, e por conseguinte no atual de 2002. Todavia, o mais impressionante, por exemplo, é a sua influência em outros países latino-americanos como a Argentina, o Uruguai e o Paraguai.

O Código argentino não só reproduziu inúmeros artigos do Esboço como seguiu-lhe a orientação geral. Em carta dirigida ao notável civilista argentino Velez Sarfield, registra Teixeira de Freitas: «Vi que compreendeu perfeitamente o meu sistema; e nada mais grato para mim do que essa espontânea uniformidade de idéias, que assim fortalece a verdade da síntese que ousei formular».

No Código Civil do Uruguai é considerável a influência do Esboço e, no do Paraguai, quando adotou (como lei sua) o código argentino, têm evidência própria as diretivas do texto e das idéias de Teixeira de Freitas. Recordem-se das tentativas (após o Esboço) de codificação de que se encarregaram Nabuco de Araújo (apenas iniciada) e de Felício dos Santos, que resultaram infrutíferas ou, ao menos, sem resultado que se poderia designar prático.

Com a proclamação da República, acentuou-se a atividade legislativa em matéria de Direito Civil (casamento civil, Registro Torrens, normas relativas a sucessões e a títulos ao portador, por exemplo) e foi retomada a elaboração de projeto de Código Civil, inicialmente a cargo de Coelho Rodrigues e, após, com êxito, do extraordinário Clovis Beviláqua, e hodiernamente com os trabalhos multipessoais da Comissão revisora e elaboradora do Código Civil de 2002.

Foi o Código Civil de 1916, ao tempo de sua sanção, a mais independente das codificações americanas no particular, se bem que, à vista desarmada, revele as influências recebidas do Código de Napoleão, do Código Civil português e do BGB.

Jurista do Atlântico Sul, ao lado do Norteamericano, de Joseph Story, 1779/1845, o jurista do Hemisfério Norte e do Chileno-venezuelano, de Andrés Bello, 1781/1865, o Jurista do Oceano Pacífico e dos Andes. Não faria Freitas o Código Civil do Brasil, mas veio a ser o codificador latino-americano. Após a elogiosa aprovação em 1858 por notável comissão de juristas da Consolidação, o Governo Imperial, em 1859, encarregou Teixeira de Freitas de fazer o Projeto do Código Civil.

O “Cujácio brasileiro”, expressão cunhada pelo senador Cândido Mendes, apresentou, de 1860 a 1865, em diversos fascículos, depois reunidos em 2 tomos, o seu Projeto, com o modesto título, «Código Civil - Esboço - por A. Teixeira de Freitas», aparecendo em 1860 com um Título Preliminar, Do Lugar e do Tempo, e a Parte Geral, Livro Primeiro Dos Elementos dos Direitos, Das Pessoas, Das Coisas, Dos Fatos; em 1861 sai a Parte Especial, Dos Direitos — Livro Segundo, Dos Direitos Pessoais, Secção I, Dos Direitos Pessoais em Ge­ral e mais outro. Secção II, Dos Direitos Pes­soais nas Relações de Família. Afinal em 1864 e 1865 aparece a outra secção do Livro Segundo, a de n° III, Dos Direitos Pessoais nas Relações Civis, e do Livro III, Direitos Reais, as Secções, Direitos Reais em Geral, Sobre Coisas Próprias, Sobre Coisas Alheias, que foi até Servidões sem se completar. No todo publicara 4.908 artigos, tendo ainda muitos outros em manuscritos, 200 e tantos, e em aperfeiçoamento a parte final; herança, concurso de credores e prescrição. E era o mesmo Esboço acompanhado de notas, que cons­tituíam um comentário histórico, doutrinário e filosófico dos respectivos artigos.

O próprio Teixeira de Freitas, de uma intransigente probidade científica sempre num constante anseio de perfeição, veio a se convencer em 1866, que devia mudar todo o plano da obra, e, em vez de um Código Civil fazer um Código Geral, dominando a legislação inteira, com definições, regras sobre a publicação, interpretação e aplicação das leis, e a Parte Geral do Esboço pessoas, coisas e fatos e um Código Civil, unificando o direito civil e comercial, com a divisão que vinha da Consolidação. E disse ao Governo que se este estava «satisfeito com os trabalhos» o autor estava «mal contente», não queria transformar um Ensaio que, «lealmente publicara sob o título de Esboço, num Projeto de Código e por isto repudiava a sua obra e só aceitaria continuar com o novo plano. Admitida essa idéia pelo Conselho de Estado em 1868 como «coisa nova... uma invenção que pode dar glória a seu autor e ao pais», foi, todavia, repudiada pelo Governo que afinal em 1872 rescindiu o contrato com Teixeira de Freitas, após insistir para que ele volvesse ao seu plano anterior.

Mas o «Esboço» chegara às mãos do insigne jurista argentino, Dalmacio Veiez Sarsfield que trabalhava desde 1864 para «redactar el proyecto dei Código Civil de Ia República Argentina» e estava em dúvida sobre «el método que debia observar en la composición de Ia obra». Noticiando-o diz o seu biógrafo, Abel Chaneton[7].

No “Projeto de Código Civil para Ia República Argentina”, Livro Primeiro, 1865, se via carta de Vélez Sarsfield ao Ministro da Justiça, de 21 de julho daquele ano, declarando, textualmente, que se servira: «sobre todo del proyecto del Código Civil que esta trabajando para el Brasil el Senor Freitas, del cual ha tomado muchísimos artículos», e, ainda: «yo he seguido el método tan discutido por el sábio jurisconsulto brasileño en su extensa y doctíssima introducción a Ia recopilación de Ias leyes del Brasil». Tomara, ainda, notas de Freitas, incluídas na edição oficial do Código.

Em carta datada de 11 de outubro de 1865, escreve Vélez a Teixeira dizendo que tomara o Esboço para seu guia na organização do Projeto, e acrescenta ele que iria provocar do povo e do governo argentino a manifestação em honra de Freitas, respondendo ele em 22 de novembro seguinte considera aquela carta «Uma das mais estimáveis recompensas que possam merecer meus trabalhos de Codificação Civil», aditando: «Vi que compreendeu perfeitamente meu sistema; e nada mais grato para mim do que essa espontânea uniformidade de idéias...» terminando pela oferta «do meu retrato, como franco sinal do apreço em que tenho sua respeitável pessoa». (Cartas de Freitas publicadas em Revista de Derecho, Historia y Letras, de Buenos Aires, vol. 68/527 e segs.).

Martinez Paz após haver comparado, colocando-os paralelamente, os planos do Esboço e do Código Civil Argentino, mostrou que «a Ia más simples inspección se advierte de Ia profunda analogia existente» e conclui nestes termos: «Si Ia influencia del pensamiento de Freitas sobre el espíritu y el método del Código Civil Argentino resulta evidente, no menos notória y decisiva aparece en Io que se refiere a Ia técnica particular, a Ias soluciones legales, a los textos mísmos de Ias disposiciones».

Tão profunda a influência de Freitas no Código Civil Argentino que o seu Esboço, que no Brasil jamais teve até 1952 uma edição conjunta, existindo apenas, esparsos, os fascículos sucessivamente aparecidos, foi, na Argentina, publicado completo, em duas edições. A primeira, «Código Civil - Proyecto por A. T. de Freitas, traducido al castellano por Arturo Pons, Buenos Aires, Imprenta El Hogar y Ia Escuela, 1900, en três tomos», com um prólogo de Luís V. Varella, onde se lê: «preparo el sábio jurisconsulto Doctor A. T. de Freitas, sin duda alguna, uno de los monumentos más ímperecederos que Ia intelectualidad sudamericana ha levantado a Ia ciencia jurídica moderna», que era a «Base adoptada por nuestro ilustre codificador ai preparar su propio trabajo» e se conclui: «Bastaria esta sola circunstancia para hacer comprender cuan importante es, en el estúdio de nuestra legislación de fondo, el conocimiento de Ia obra de Freitas. E n ella se encuentra, no solo el texto de los artículos que adopto el legislador argentino como princípios dei derecho próprio, sino también su explicación, su comentário y hasta sus concordâncias, puestos en Ias copiosas notas con que Freitas apoya cada una de Ias disposiciones que proyecta» (Op. cit., I, IV e V). A segunda edição, com o seguinte título: «A. T. de Freitas, Código Civil, Obra fundamental dei Código Civil Argentino, traducción castellana. Tomos I y II, Buenos Aires, 1909, A. Garcia Santos y J. Roldán».

Há que se notar que o Dr. Juan António Bíbloni autor de um Projeto de Reforma do Código Civil, escreveu Abel Cháneton: «Sabia a Freitas de memória:..». E quando Alberdí, confessando que não conhecia os trabalhos de Freitas, criticava a Vélez Sarsfield por não ter seguido o Código Civil Francês e seus autores. Porchat ou Portalis, Vélez respondeu-lhe: «jo después de un serio estudo de los trabajos dei senor Freitas los estime solo comparables con los de Savigny».

Martinez Paz conclui sobre Freitas: «Después de su muerte, una memória Ilena de veneración conserva su nombre, y su fama ha ido acrescentándose, a tal punto que sin hesitación puede afirmarse que ocupa hoy el puesto más saliente en Ia historia del pensamiento jurídico americano; otros habrá de acción más universal, más humana, que se hayan agitado y participado más intensamente de Ias preocupaciones de su tiempo, que hayan contribuído más eficazmente a Ia solución de los problemas nacionales, pero ninguno, sin excepción, ha alcanzado como jurista Ias alturas escaladas por Freitas; con él comienza en América Ia línea original de Ia dogmática jurídica, sin que pueda afirmarse que sus continuadores hayan tenido el poder de comunicarles un mayor esplendor».

No que tange ao Uruguai o Projeto de autoria do Dr. Tristán Navais, que ele enviou a Freitas e este agradeceu e elogiou, foi examinado por uma Comissão Revisora, da qual Navais também fez parte e que declarou ter que confessar haver se servido entre os antecedentes para seus trabalhos do «Proyecto del senor Freitas (inconcluso aún), el trabajo más notable de codificación por su extensión y por el estudio y meditación que revela». Na obra citada em 1910 pelo Dr. Ricardo Narvaja, «Fuentes, Notas y Concordâncias dei Código Civil de Ia República Oriental del Uruguay», se publica a carta de Freitas com a nota «el Savigny americano».

Quanto ao Paraguai, que adotou o Código Civil argentino, a obra de Freitas é de trato, citação e elogio diuturno dos seus principais juristas, Cecílio Baez, De Gasperi, Raul Sapena Pastor, a propósito, disse dele o eminente De Gasperi em carta aberta aos estudantes que «Teixeira de Freitas es el único jurista americano que puede alternar en Ia história con Savigny y los padres de Ia codificación germana».

Não somente a América platina, mas também na região influenciada por Andrés Bello, em que domina o Código Civil do Chile, na região do Pacífico e dos Andes, pois o importantíssimo tratado do notável jurista equatoriano, Dr. Luís Borja, «Estúdios sobre el Código Chileno, 8 tomos», tem contínuas referências aos trabalhos de Freitas. E até na América Central chegou a influência do nosso insigne patrício, uma vez que o Código Civil de Nicarágua, de 1904, reproduziu nos seus artigos VII e VIII os artigos 6° e 7° do Esboço, copiados através dos artigos 13 e 14 do Código Civil Argentino.

Teixeira de Freitas escreveu, em carta de 20 de setembro de 1867, que se encontra na íntegra no Livro de Sá Víanna, págs. 169 a 187 a sua opinião de que era incompleto um Código Civil, e propôs dois Códigos, um Geral, e um Civil, mas lato sensu.

«O Código Geral «dominará a legislação inteira», abrangendo «matérias superiores a todos os ramos da legislação», «sobre as leis em geral, sua publicação e aplicação», «regras da interpretação», «providências sobre computação de pra­zos» e terá o Livro 1°, das Causas Jurídicas com 3 Seções, Das Pessoas, Dos Bens e Dos Fatos, e o Livro 2°, Dos Efeitos Jurídicos. Tal Código «das leis civis tira todas as disposições elementares sobre pessoas, bens e fatos; das leis do pro­cesso, ou qualquer outras, separa as disposições que regulam as provas; do atual Código do Comércio removerá o que conserne a estas mesmas matérias e do Código Penal apartará toda a teoria e nomenclatura dos delitos, como parte integrante da teoria dos atos ilícitos».

A novel teoria sobre a elaboração de um Código ou de uma Lei Geral, acima dos Códigos Civil, Penal, Processual, etc., com a matéria das próprias leis, sua vigência, interpretação, com as normas de direito internacional privado e de direito intertemporal, era, então, audaciosíssima, e, é todavia, a mais coerente com o sistema do direito brasileiro.

Encontramos as repercussões dessa idéia nas Leis e Regras Gerais Horei (Japão) de 1898, na Lei sobre Fontes do Direito do Estado do Vaticano de 1929, e, ainda em parte, no Código Civil Italiano de 1949, são exemplos daquele justo ideal de Freitas de um Código Geral. O comparatista francês René David ao participar dos trabalhos de revisão do Código Civil Francês constatou o fato[8].

Atente-se, ainda, no sistema de distribuição das matérias, para o caráter francamente precursor da inovação de Freitas, iniciada na Consolidação e completada no Esboço, do estabelecimento duma Parte Geral no Código, para as Pessoas, Bens e Fatos, que Raoul de La Grasserie salientou já em 1897[9].

No «Tratado de Ias Obligaciones en el Derecho Civil Paraguayo y Argentino», 3 vols., 1945-1946, do jurista paraguaio De Gasperi, em diversos capítulos referentes à «Teoria de los Hechos y Actos Jurídicos», Capts. XI, XIV, XVI, XXV, XXXIII, etc., rende uma justa «homenage de justicia histórica ai talento esclarecido dei sábio jurista que fué Teixeira de Freitas” vol. I, § 396, págs. 346/9, c/ § 391 e págs. 335 e 167[10].

Um Titulo Preliminar abria o Esboço e os seus títulos subseqüentes, consolidando na Parte Especial, cada instituto do direito privado de per si. A saber. E.g. «Título Preliminar — Do Lugar e do Tempo — Art. 1° — As leis deste Código não serão aplicadas fora de seus limites locais, e nem com efeito retroativo. Art. 2° — Os limites locais de sua aplicação serão neles designados. Os limites de sua aplicação quanto ao tempo serão designados em uma lei especial transitória, as disposições sobre esses limites locais estão disseminadas no Código inteiro, pela necessidade de aproximá-las a cada uma das matérias».

Nos artigos 3° a 7°, sobre o lugar de aplicação da norma, a lei do domicílio é consagrada, assim como a alegação e prova da lei estrangeira, a ordem pública, o favor negotti, etc., e, na Parte Especial, ao lado de cada matéria, p. ex., da capacidade, da forma dos atos, dos impedimentos de casamento, etc., as regras pertinentes para a solução dos conflitos de leis, como princípios gerais para a parte especial do Esboço.

Compatível com as idéias de justiça que sustentava, e que resultava, diretamente, do repúdio, por ele feito, da revelha teoria dos estatutos, pessoais, reais e mistos, que considerava “craveira artificial”, sem “a menor importância”, de «só valor histórico», e de sua rejeição da doutrina gaulesa da reciprocidade, «apresento um projeto de Código onde o legislador marca os limites locais da aplicação das leis, sem lhe importar a recriprocidade e o que se fez, ou faz ou se fará em países estrangeiros», como já disse o grande Haroldo Valladão, de quem nos valemos das referências aqui expendidas, o sistema da reciprocidade em direito internacional é egoísta e anti-cristão.

Na obra La codificación Civil en Iberoamerica-siglos XIX y X - Editorial Jurídica de Chile, muito embora o ilustrado autor, colega romanista, incorra em manifesta erronia quanto ao § 60 do capítulo X - Los esfuerzos por la codificación del Derecho Civil en el Brasil hasta 1893, quando diz, verbis- «......El território que recibiría el nome de Brasil fue descubierto por algunos navegantes españoles (sic) y después redescubierto, en 1500, por Pedro Alvares Cabral....”». A bem de ver, reconhece o autor santiaguense a importância de Teixeira de Freitas em vários passos da sua obra e termina por demonstrar em um quadro sinóptico de nº 10, que uma das fontes da codificação moderna do direito civil latino americano está no corpus de Teixeira de Freitas.

 

QUADRO SINÓPTICO-X

LA INFLUENCIA DEL ESBOÇO DE AUGUSTO TEIXEIRA DE FREITAS

 

PROYECTO TEIXEIRA DE FREITAS

1859-1867

 

 

 

 

5. – Referências Bibliográficas

 

Alencar, José de (historicamente adverso à obra de Freitas). Relatório do Min. da Justiça a Assembléia Geral Legislativa na 1ª sessão da 14ª Legislatura. Rio de Janeiro, 15 de Maio, 1869.

 

“Parecer como ‘membro da Comissão Revisora de 1865’. In Relatórios e Pareceres dos Membros de Comissão encarregada de examinar o projeto de Código Civil do Império. Rio de Janeiro, Tipografia Nacional, 1865.

 

Barreto, Plínio. “Teixeira de Freitas”, in Revista da Faculdade de Direito do Recife, Vol. 24, p. 98, 1916.

 

Bastos, Filinto Justiniano Ferreira. “O Direito Romano e o Dr. Augusto Teixeira de Freitas”, in Revista da Faculdade de Direito da UFBa, Salvador, 1956.

 

Bello, Andrés. Estúdios sobre Andrés Bello. Santiago, Fondo Andrés Bello, 1966.

 

Bevilacqua, Clóvis. “Augusto Teixeira de Freitas”, in Revista Acadêmica da Faculdade de Direito, Recife, 1905. Vol. 13, p. 181.

 

Blanc, Ernesto F. Nieto. “Augusto Teixeira de Freitas” (Tradução de Artur de Castro Borges), in Scientia Jurídica. Pp. 620 a 652 – publicado inicialmente em castelhano em La Ley, revista Argentina de Jurisprudência, Doutrina e Bibliografia, 1 abr, 1968.

 

Carvalho, Luis Gastão de Alencar Franco de. “Teixeira de Freitas, o Sábio Jurisconsulto”, in Revista dos Tribunais, Ano 60, set. 1971, Vol. 431, pp. 251 e segs.

 

Chacon, Vamireh. Da escola do Recife ao Código Civil. Rio de Janeiro, Organização Simões, 1969. 

 

Colmo, Alfredo. Técnica Legislativa del Código Civil Argentino. 2ª ed. Buenos Aires, Lib. Bartolomé Mitre, 1927.

 

Cotrim Neto, Alberto B. “Dalmacio Vélez Sarsfield, um filho espiritual do Brasil”, in Justitia, Vol. 2, p. 112 (nºs 5 e 6), Rio de Janeiro, 1934-35. 

 

DANTAS, SAN TIAGO. Figuras do Direito. Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1962.

 

Fonseca, Arnoldo Medeiros da. “Teixeira de Freitas e o pensamento juridico contemporaneo”, in Livro do Centenário, Rio de Janeiro, Ed. J. do Comércio, 1948.

 

Freitas, Augusto Teixeira de. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro, G.L.Garnier, 1882.

_________ Código Civil e Criminal. Rio de Janeiro, 1882.

_________ Formulários de Contratos e testamentos e outros atos do tabelionato. Rio de Janeiro, 1882.

_________ Pareceres in “Consultas jurídicas ou Coleção de Propostas etc. Respondidas pelos primeiros jurisconsultos brasileiros”, coligadas por João José Rodrigues, 2 tomos, Rio de Janeiro, Eduardo & Henrique Laemmert ed., 1873.

________ Primeiras linhas sobre o Processo Civil (por Joaquim José Caetano Pereira e Sousa), Rio de Janeiro, 1877. 

________ Legislação do Brasil. Aditamento a Consolidação das Leis Civis, Rio de Janeiro, 1877.

________ Regras do Direito. Rio de Janeiro, B.L. Garnier, 1882.

________ Prontuário das Leis Civis. Rio de Janeiro, Instituto Tipográfico do Direito, 1876.

________ Resposta ao parecer do Dr. Antonio Joaquim Ribas ao projeto do Código do Império”, in Relatório e Pareceres, p. 49, Rio de Janeiro, 1865.

_______ Aditamentos ao Código do Comércio. Rio de Janeiro. Tipografia Perseverança, 1878.

________ Consolidação das Leis Civis (5ª edição muito aumentada com as leis, decretos e avisos publicados até 1913), Rio de Janeiro. Jacinto Ribeiro dos Santos, 1915.

 

Gierke, Otto. La funcion social Del Derecho Privado. Madrid. Sociedad Editorial Española, 1904.

 

Kelsen, Hans. La idea del Derecho Natural y otros ensayos. Buenos Aires, Editorial Losada, 1968.

 

Lins, Edmundo. Teixeira de Freitas, in Miscelanea, p. 87. Rio de Janeiro, 1938.

 

 



 

[1] «....A tenacidade dos meus estudos deu o último resultado de um plano vastíssimo, de que V. Excia. será mais tarde inteirado, e que provavelmente merecerá sua valiosa aprovação. Levar a efeito esse plano em forma de codificação, ou de trabalho científico, eis todo o empenho de minha vida...» (Revista de Derecho, Historia y Letras, de Buenos Aires, vol. 68/531).

 

[2] Seu estilo, na redação das leis, é claro, elegante e nobre. Nos comentários, sem perder a sobriedade, que torna a frase incisiva, nem sempre conserva a flexibilidade correspondente ao desdobrar do raciocínio, invariavelmente seguro, e a intuição constantemente lúcida. A técnica é perfeita, e, nas suas mãos adestradas, faz-se um poderoso instrumento de precisão, para as idéias, e de ressonância, para a argumentação. Clóvis Bevilácqua, Linhas e Perfis Jurídicos, p. 131).

 

[3] «Em Moraes achamos a palavra equidade definida por tempera­mento do rigor da lei, fundado em boa razão. Ninguém por certo dirá que o rigor de justiça, que nos obriga a dar o seu a seu dono, a não usurpar os bens ou direitos alheios, a não ofender em coisa alguma nossos semelhantes, etc., possa ou deva ser moderado, e temperado, pela eqüidade» - Vocabulário, op. cit.

 

[4] «Homem é um ente que sente, pensa, e reflete, passeia livremente pela superfície da terra, que domina todos os outros animais, que vive em sociedade, que tem inventado as ciências e artes, que tem a bondade que lhe é própria, e que é suscetível de virtudes e vícios. "Respectivamente ao que ele tem de matéria, ao seu nascimento, crescimento, e morte, é o homem físico; e, neste ponto de vista, pertence à História Natural e à Medicina, se se considera como capaz de diferentes operações intelectuais, que o fazem bom ou mau, útil ou nocivo, benéfico ou malfazejo, o homem moral então pertence à Moral, e à Metafísica...se do estado solitário passa para o estado social, e se examinam os princípios gerais pêlos quais se tiram dele as possíveis vantagens, é o homem político, etc...»: in Diccionário Jurídico - vocábulo homem, Pereira e Sousa, Rio de Janeiro, 1842, Ed. Laemmert.

 

[5] «...Dignidades são distinções, merecimentos, qualidades honoríficas, que enobrecem os estados dos homens, quando bem merecidas; porquanto as distinções públicas não se instituirão para os homens como tais, mas só para recompensa de seus méritos verdadeiros. Infelizmente acontece quase sempre o contrário!» -Vocabulário, op.cit.

 

[6] «Equidade, no sentido primitivo e verdadeiro, é o mesmo que justiça (não concordo), são palavras sinónimas, entendendo-se por ambas a disposição de ânimo constante, e eficaz, de tratar qualquer ente, como ele é; e de contribuirmos, quanto está em nós, sem prejudicar-nos, nem prejudicarmos a outros, para o fazermos perfeito e feliz. Alguns moralistas confundem a equidade com a caridade, dizendo querela consiste em não exigir com rigor o que nos é devido, e em relaxar voluntariamente alguma parte dos nossos direitos reais. Às vezes a lei positiva se opõe à equidade natural, mas isto provém do defeito da lei, que não pode prever e acautelar todos os casos; sendo certo que uma lei justa em um caso pode vir a ser injusta em outro, o que é uma consequência dos limites do espírito humano. Neste sentido é que os jurisconsultos se servem da palavra eqüidade, para aporem à ideia da palavra lei, querendo significar que a justiça se exerce antes, não segundo o rigor da lei, mas com moderação e modificação racionável. A equidade, que vulgarmente se chama equidade de Bârtolo, e que teve lugar na sucessão dos prazos vitalícios, e no direito da renovação deles, não foi inventada por Bârtolo; mas estabelecida em direito natural, que não consente que alguém tire lucro da perda alheia — Lei de 9 de setembro de 1770, § 90». - Dicc. Pereira e Sousa, op.cit.

 

[7] «...Fué entonces que descubrió a Freitas. El contacto intelectual con ese profundo removedor de conceptos jurídicos, e ensenó a disciplinar su vasta cultura, afino su critério, preciso sus ideas. La posibilidad de abordar con êxito Ia obra definitiva de Ia codificación civil, debió presentarse entonces a su espïritu con evidencia meridiana»: Teixeira de Freitas, Buenos Aires, 1889, De Palma, pág. 143).

 

[8] «Cela nous permet de mesurer Ia grandeur de ce juriste qui, sans avoir jamais visite l´Europe, sans avoir jamais quitté le Brésil (sauf pour une courte visite à Uruguay voisin) est arrivé, par Ia puissance de Ia réfiexion et par l´étude de Ia théorie juridique, à formuler, il y a 80 ans, des propositions qui nous sont présentées commé neuves en France á heure actuelle»: René David, Les Grands Sistèmes du Droit Contemporain, Paris, 1985, ed. Payot, pág. 96.

 

[9] Cette division est três logique. C'est ce qui a fait tout récemment le nouveau Code alemand. Ainda o mestre René David ressalta, passim op. cit. o caráter originalíssimo de Freitas «Il a été avant quarante ans la doctrine adoptée par le Code Civil alemand (B.G.B.) auquel on atribue en general le mérite de cette innovation. Non content d'avoir été un précurseur de Codes plus modernes, en faisant préceder son Code d'une partie générale, il est à nouveau un précurseur dans l´affirmation de cette doutrine d'unité do droit civil et du droit commercial qui devait, par Ia suite, séduire tant d'esprits».

 

[10] Como precursor de Ia concepción subjetivista de Ia causa, tal como Io explica Josserand en «les Mobiles dans les Actes Jurídiques», se confirma en la nota de Freitas nel art. 445 del Esboço, donde se conclueestaba magistralmente informado acerca de esta matéria. No es que él haya sido anticausalista, como se pretende; por el contrario, era causalista, pero en tanto por causa de entienda Ia «intención» que preside Ia formación de todo acto voluntário (vol. I, pág. 348).