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FOTO GRAÇAS BRITTO-1S3010205MARIA DAS GRAÇAS PINTO DE BRITTO*

 

SILNEY ALVES TADEU*

 

Universidade Federal de Pelotas/Brasil

 

 

O modelo quam in suis segundo o Corpus Iuris da conduta exigível no cumprimento das obrigações

 

 

RESUMO: I. Introdução. – II. A diligência do bom pai de família como modelo geral de conduta. – II.a. A evolução do significado bom pai de família. – II.b. A função da diligencia de um bom pai de família a partir da codificação. – II.b.1. O artigo 1137 do Código Civil Francês. – II.b.2. A configuração da diligencia do bom pai de família como modelo de conduta não especializado. – II.b.3. O artigo1176 do Código Civil Italiano de 1942. – II.b.4. Diferenças entre o artigo 1176 do Código Civil Italiano de 1942 e o artigo 1224 do Código Civil Italiano de 1865. – II.b.5. A diligencia como critério objetivo e geral no artigo 1176 do CC Italiano. – III. A diligência do bom profissional. A perícia como medida do cumprimento exato da prestação profissional. – III.1. Evolução da noção de perícia. Do “artifex” ao profissional. A máxima “imperitia culpae adnumeratur”. – III.1.a. No Direito Romano clássico e pós-clássico. – III.1.b. No antigo Direito de las Siete Partidas da Espanha. – Referencias Bibliograficas. – Resumen.

 

 

I.Introdução

 

Entre os modelos de conduta que integram a normal diligencia que um sujeito deve observar no exato cumprimento de uma obrigação, cabe ressaltar o modelo quam in suis que remonta ao Corpus Iuris, identificando-se como o próprio atuar do devedor em seus “assuntos próprios”. Este tipo de diligencia estava previsto no Direito romano para uma série de relações obrigatórias[1]. A aplicação deste modelo de diligencia quam in suis implica em que o devedor deve comportar-se no cumprimento de suas obrigações, do mesmo modo que se comportaria na gestão de seus próprios negócios ou interesses, desta maneira, ela se encontra vinculada por sua conduta habitual que deve vir estampada como a que melhor se exige em sua maneira de proceder em relação às obrigações assumidas.

Com isso podemos induzir que o devedor não há de seguir como pauta de seu comportamento no cumprimento das obrigações por ele assumidas, munido de uma diligencia específica e distinta da normal e usual em suas relações; não se trata de um quantum fixo de diligencia, e sim de uma variável em função das condições do sujeito obrigado eiusdem conditionis homo. Com efeito, o referido modelo de conduta representado pela diligencia em pauta, toma como medida as condições pessoais do sujeito, sua aptidão e esforço no desempenho da lex artis; em definitivo, seu comportamento corrente na gestão de seus assuntos e interesses. Segundo BADOSA COLLI[2], a característica deste modelo de conduta quam in suis é que a qualidade de devedor que assume o sujeito não impõe nenhuma modificação no tipo de conduta que o sujeito vinha observando até o momento, ou seja, aproxima-se do venire contra factum próprium.

Devido a estes parâmetros, fica praticamente impossível, na maioria dos casos, determinar o conteúdo de tal modelo de conduta no exato momento do nascimento das obrigações, já que estará em grau máximo do que se considera normal em particular para o devedor em concreto, Ademais, não poderá se considerar culposo o inadimplemento da prestação quando, para conseguir o cumprimento foi necessário um esforço superior a manifesta possibilidade do obrigado, beirando a um dolus bonus. Deste modo, se pode dizer que a comparação da conduta do obrigado, não como um modelo abstrato, e sim com seu próprio comportamento habitual implicaria uma atenuação do rigor do modelo de diligencia, já que não se exigiria mais do que se exigiria de um bom pai de família, ou seja, uma diligencia menor, mas com habitualidade no comportamento do obrigado rebus suis consuetudinem neglegentia, será suficiente. De outro modo, a violação da diligencia leva consigo a culpa in concreto, frente à culpa in abstratcto que surgiria daqueles modelos de condutas abstratos como aquela do bonus et diligens pater familias.

Para tanto, esse modelo de diligencia quam in suis, se erige em um parâmetro concreto, devido a que não suscetível de ser trasladado a outras relações obrigacionais distintas e nem a outros sujeitos diversos, já que a referencia da diligencia que é exigível, vem dada pelo modo de comportar-se habitualmente do devedor. Assim, a imprecisão desta diligencia exige uma determinação do que se considera como um comportamento habitual do devedor, que se leva a cabo através de um processo de abstração que, devido a considerações durante um determinado período de tempo e de um certo número de atos, atitudes exteriorizadas pelo comportamento do devedor e que permita extrair o quantum de diligencia ele empregou de maneira habitual em sua lex artis[3].

Entretanto, ainda determinado o comportamento do devedor que se considera “normal” ou cotidiano em sua forma de atuação, parece claro para que tal modelo possa operar. Devem impor-se certos limites a discrecionalidade que de outro modo poderia carrear, já que do contrário, o caráter de variação e de mutação deste modelo de conduta em função das circunstâncias particulares de cada sujeito que deixaria o credor em uma situação amplamente desfavorável, ao arbítrio do comportamento de uma pessoa totalmente negligente em seus interesses. Para resolver esta situação, os glosadores e pós-glosadores conceberam como limite o modelo abstrato do “comum dos homens” e que consistia numa diligencia mínima exigível, de tal modo que se o devedor em suas coisas próprias observava uma diligencia inferior da exigida pela communis natura hominum, ainda que tivesse adotado na relação obrigatória a diligentia quam in suis, se considerava que havia concorrido com culpa lata com base na diferença existente entre os critérios. Frente a este modelo de conduta que paulatinamente se vai abandonando, cobra maior importância a conduta abstrata do bom pai de família e que será incorporado por grande parte dos Códigos europeus modernos como parâmetro para a valoração do cumprimento das obrigações assumidas.

 

 

II. – A diligência do bom pai de família como modelo geral de conduta

 

Com a finalidade de melhor compreender o sentido deste modelo de conduta que evolucionou através dos tempos, convém realizar uma breve resenha sobre a origem da figura do bom pai de família, observando as mudanças ocorridas em sua concepção desde o Direito Romano até a época das Codificações, a qual nos permitirá uma melhor análise desta figura tal como aparece configurada no nosso Código Civil atual, matizando que esta tarefa se pode justificar na utilidade que se mostra este modelo de diligencia, cotejando com aquele que serve de parâmetro de comportamento quando o sujeito obrigado ostenta uma condição especial ou adicional do “bom pai de família” quando se trata de um profissional no exercício de sua lex artis.

 

 

II.a. – A evolução do significado bom pai de família

 

A figura do bom pai de família, de origem romana e teorizada sobre tudo no Direito pós-clássico e justinianeo, responde a necessidade dos Códigos modernos encontrar a referencia a um só grau de diligencia exigível ao devedor no cumprimento de suas obrigações e que adquire medida e extensão em relação com um tipo abstrato de homem. Este modelo vai adquirindo seu crescimento como figura que sempre aparece referida a uma conduta materialmente idônea e que cumpre a função de objetivação da diligencia exigível a qualquer devedor. Ela se erige em um modelo de diligencia por excelência, em quanto que se afigura como um modelo de exigência universal ou abstrato, tanto que foi observado em distintos textos legais civis.     

As fontes romanas se referem de bônus, prudens o diligens pater famílias, entretanto, esta expressão não se corresponde identicamente com a que mais tarde, por obra da Codificação vai se afirmar como a de um “bom pai de família” e isto é devido a que em Roma a expressão mencionada faz referencia em todos os casos ao cidadão sui juris que vem caracterizado pela administração diligente e cuidadosa no trato de seus próprios assuntos. Esta figura, destinada a se converter em um modelo abstrato de conduta exigível no cumprimento das obrigações, encontra-se já em seus escritores no jurídico da época republicana, indicando aquele homem ativo e moderado em sua atividade agrária como se refere GIORGIANNI[4].

Assim, de imediato esta figura alcançou os limites de certos tipos de obrigações fundamentalmente naquelas de dar, servindo, segundo os autores clássicos a necessidade de reduzir a um modelo abstrato o comportamento a que o devedor está obrigado como apontado por DI MAJO[5]. Neste sentido o Direito Romano das obrigações, situa-se no centro da valoração do comportamento do devedor à figura do paterfamilias e que se põe decididamente em contraste com os ordenamentos mais antigos, que excluíam qualquer consideração subjetiva de responsabilidade. Para julgar a suficiência do quantum diligentiae foi empregado pelo devedor no cumprimento de suas obrigações, podiam-se empregar referencias de um lado, a figura abstrata do bonus pater famílias e de outro, o quantum habitual do próprio devedor, referencias estas que paralelamente davam lugar a culpa in abstracto e in concreto[6]. Deste modo configuravam-se dois modelos de diligencia in abstracto (do bom pai de família e do artifex) frente ao modelo concreto que viria representado na figura da diligencia quam in suis como já nos referimos anteriormente.

Foi durante a época pós-clássica, segundo grande parte da doutrina romanista, quando se elabora uma divisão da culpa em lata e levis, a que se fazia a corresponder a diversos graus de diligencia (diligentia, diligentia diligentis, diligentia diligentissimi) normalmente em relação com a vantagem que as partes obteriam no contrato (utilitas contrahentium)[7] e nesta harmônica construção a diligencia do bom pai de família e o correspondente grau de culpa configuravam-se no centro. Não obstante, os autores não se mostraram unânimes em determinar os distintos graus de culpa e de diligencia que aparecem na compilação de Justiniano, existindo, de outra parte, discrepâncias em torno ao significado que se atribui ao modelo abstrato de referencia, isto é, a figura do bonus et diligens pater familias. De outro lado, deve-se ter presente que durante a época de Justiniano a noção de diligencia adquire uma nova dimensão, ao compreender junto à consideração, o compromisso de um bom fazer, certos componentes de capacidade (mens, consilium, sanitas, prudentia) e de competência (scientia, peritia). Desta maneira, se faz entrar na culpa a impericia do artifex, configurada como a omissão da diligencia ou a falta de previsão do previsível, tendo em conta a profissão do devedor e que constitui o motivo essencial para a conclusão do contrato[8].

Frente a figura do artifex como possuidor de uns conhecimentos teóricos ou práticos que são tidos em conta ao contratar uma prestação determinada, o modelo de conduta representado no bom pai de família vem caracterizado por sua profissionalidade, por ele, a diligencia do bom pai de família há de vir no modelo de diligencia exigível ao devedor no cumprimento da execução de suas obrigações, sempre quando a prestação devida não venha determinada pela posse de determinados conhecimentos particulares[9]. A doutrina medieval, tomando como ponto de partida a sistematização da culpa realizada nas fontes de Justiniano, pretendeu a elaboração doutrinal de uma conceitualização desta, harmonizando as diversas codificações existentes. O sistema elaborado pelos glosadores se baseia na tripartição da culpa em três espécies: culpa lata, culpa levis e culpa levissima, ao mesmo tempo em que, correlativamente se distinguem três principais graus de diligencia: uma mínima “diligentia”, uma “diligentia exacta” e uma “diligentia exactissima”, precisando que a culpa levissima é a falta da diligencia exigida de um bom pai de família extraordinariamente cuidadoso com suas coisas “diligentissimus”.

No Direito Comum, o modelo do paterfamilias integra a “diligentia exacta” exigível no cumprimento obrigacional, entretanto não é o único, sem que junto a ele se encontra o genérico de “natura hominum”, segundo a terminologia empregada por BÁRTOLO[10]. Entretanto, frente ao “paterfamilias”, este modelo de comportamento representado pela conduta comum e habitual dos homens, responde ao dever de prestar uma diligencia mínima, e não uma diligencia exata, de modo que a sua infração se faz corresponder a culpa leve. Em efeito, tanto no âmbito contratual como extracontratual, para os juristas medievais, não só se devia atuar com uma diligencia mínima, senão com uma “exacta diligentia” que se corresponde, acolhendo a expressão das fontes justinianeas, a atuação do “diligens paterfamilias”. Constitui a diligencia que, como regra geral se exigia a todas as relações obrigatórias. Pelo contrário, em certas relações jurídicas que comprometiam ao máximo a responsabilidade do obrigado se lhe exigia o emprego de uma “exactissima diligentia” consistente em prever aquilo que um “diligentissimus paterfamilias” preveria[11]. Desta maneira, como temos apontado, a doutrina do Direito Comum e a Codificação operaram com um conceito valorativo do que seja “bom pai de família”, o qual significa que não serve qualquer comportamento valorativo ou conduta em qualquer de suas manifestações para integrar dito modelo de um “bom pai de família”, assim, que se exige um determinado nível qualificativo não abarcando aquelas condutas que não a alcançavam.

 

 

II.b. – A função da diligencia de um bom pai de família a partir da codificação

 

II.b.1. – O artigo 1137 do Código Civil Francês

 

Na época moderna e até a Revolução Francesa, a figura de um tipo abstrato de diligencia identificada como a do “bom pai de família” tem estado sempre presente nas diversas codificações, sendo, inclusive acolhida pelo Código de Napoleão no artigo 1137, assim como nos Códigos Civis nestes inspirados. Neste sentido, cabe por em relevo que, em principio, e segundo autorizadas opiniões doutrinais, parece que as modernas codificações menosprezaram a “teoria da prestação das culpas” de origem medieval, preferindo a referencia a um só grau ou medida de diligencia, a correspondente a diligencia do bom pai de família; entretanto, esta afirmação não é respaldada por todos os autores, existindo discrepâncias doutrinarias em torno a recepção por parte dos Códigos Civis modernos da antiga graduação da culpa.

De outra parte, ainda admitindo a recepção do modelo único de conduta do “bom pai de família”, a noção de diligencia que se transfere aos distintos Códigos, vai adquirindo uma diversidade de matizes que deixam entrever a opção por uma concepção subjetiva da mesma. Convém, portanto, se deter nos estudos da configuração da diligencia do bom pai de família no Código Civil francês para, posteriormente, analisar como vai se consagrando no resto dos ordenamentos jurídicos e a função que representa em ordem a determinação do inadimplemento obrigacional e a conseguinte responsabilidade.

O artigo 1137 do referido Código supõe a consagração positiva do modelo abstrato do pai de família ao dispor:

 

L’obligation de veiller à la conservation de la chose, soit que la convention n’ait pour objet que u’tilité de l’une des partes, soit qu’elle ait pour obje leur utilité commune, soumet celui qui em est charge à y apponder tous lês soins d’um don père de famille. Cette obligation est plus o moins étendue, relativament à certains contrats, dont lês effets, à cet égrad, sont expliqués sous les titres qui les concernent.

 

Seguindo o modelo francês, o Código Civil Italiano de 1865 também acolheu a figura do bom pai de família no artigo 1224 CC, que foi transplantada ao Código Civil de 1942 como norma fundamental no artigo 1776:

 

La diligenza che si deve impiegare nell’adempimento dell’obligazione, abbia questa per oggeto l’utilità di una delle parti o di ambedue è sempre quella di un buon padre di famiglia, salvo il caso di deposito accennato nell’art. 1843. Questa regola per altro se deve applicare con maggior o minor rigore, secondo le norme contenute per certi casi in questo codice.

 

A novidade do artigo 1224 CC Italiano a respeito do artigo 1137 do CC francês radicará em que, enquanto que de fato, o citado preceito do Code formula a regra de diligencia de um bom pai de família a respeito a só uma obrigação de custodia, em relação à obrigação de conservação da coisa (l’obligation de veiller à la conservation de la chose...soumet celui qui em est charge à y apporter tous lês soins d’um bom pere de familie), enquanto que o artigo 1224 do CC Italiano de 1865 generalizou esta regra, estendendo a todas as obrigações[12].

Frente à configuração dos modelos de diligencia no sistema da Civil Law, ordenamentos jurídicos mais pragmáticos como o Anglo-saxão, parece rechaçar um parâmetro  abstrato e universal como o do bom pai de família, aplicável a todas as relações obrigatórias, preferindo que a valoração da atuação diligente (Standard of reasonable care) sejam deduzidos pelos tribunais em atenção a todas as circunstancias concorrentes no caso (all circunstances). Entretanto, apesar da função que cumpre as decisões judiciais consistentes na concretude da diligencia exigível em cada caso, ao realizar uma análise das mesmas, não se pode concluir que nos países da Comow Law se prescindia, em absoluto, de um modelo de conduta geral no cumprimento das obrigações, é dizer, de um Standard of care.

Assim, dos diversos parâmetros utilizados no Direito Anglo-saxão ou dominantes é o que vem representado pelo reasonable man que surgiu ante a necessidade de encontrar para o profissional o acomodo de sua atuação a objetivos estandards; ademais, temos que levar em conta que os Tribunais da Common Law partem de uma estrutura conceitual da negligência altamente flexível e suscetível de uma aplicação geral, na que cabe integrar distintas condutas ou graus de comportamento do sujeito, como se refere, para estes efeitos, o artigo 1224 do Código Civil Italiano de 1865:

 

La diligenza che si deve impiegare nell’adempimento dell’obbligazione, abbia questa per oggeto l’utilità di una delle parti o di ambedue è sempre quella di un buon padre di famglia, salvo il caso di deposito accennato nell’art. 1843. Questa regola per altro si deve applicare con maggior o minor rigore, secondo le norme contenute per certi casi in questo codice.

 

II.b.2. – A configuração da diligencia do bom pai de família como modelo de conduta não especializado

 

O modelo abstrato de pai de família, tal como aparece consagrado no Code francês, vem, caracterizado, precisamente pela ausência de conhecimentos técnicos, a diferença do perito que é um profissional cujo resultado exige uma execução à altura de seus conhecimentos. Esta referência à noção abstrata do homem normal ou razoável, deve ser substituída para ter em conta certas peculiaridades ou características do devedor, das que de fato dependem o conteúdo e extensão de seus deveres. Assim, o profissional vem obrigado a se comportar como um profissional normal, ficando sujeito a certas obrigações diversas de um sujeito não profissional. Desta maneira, o critério clássico do bom pai de família deve ser adaptado para se ter em conta às regras técnicas da profissão, a especialização, as exigências normais do exercício da mesma, assim como os interesses em jogo. Isto é, tratando-se de prestações profissionais, a interpretação do contrato e a busca da medida de diligencia exigível deve referir-se necessariamente as regras da lex artis. Neste sentido é a Sentença do Tribunal de Cassação francês, de 20 de maio de 1936, em matéria de responsabilidade médica, que configurou a diligencia exigível como a obrigação de dar uns cuidados «de maneira consciente, atentos, conforme os conhecimentos adquiridos da ciência, salvo circunstancias excepcionais»[13].

 

II.b.3. – O artigo1176 do Código Civil Italiano de 1942

 

Como exemplo de plasmação positiva do modelo do “bom pai de família” em seu significado objetivo, isto é, isento de qualquer conotação psicológica ou de referência anímica ao esforço da pessoa, aparece segundo grande parte da doutrina, o artigo 1176 do Código Civil Italiano vigente. Com efeito, o dever de diligencia é precisado no artigo 1176 que assim dispõe: En el cumplimiento de las obligaciones el deudor debe usar la diligencia del buen padre de família. En el cumplimiento de las obligaciones inherentes al ejercicio de uma actividad profesional, la diligencia debe valorarse en relación a la naturaleza de la actividad ejercitada.

 

II.b.4. – Diferenças entre o artigo 1176 do Código Civil Italiano de 1942 e o artigo 1224 do Código Civil Italiano de 1865

 

A novidade deste preceito revogado não radica tanto na formulação de uma noção de diligencia, como vimos precedentemente, como em sua colocação sistemática. Deste modo, enquanto o Código Civil de 1865, a norma relativa a diligencia fazia referência aos “efeitos das obrigações” (Capitulo III), e ficava localizado junto aos artigos 1225 e 1226 que disciplinavam as conseqüências do inadimplemento e os limites da responsabilidade do devedor, isto é, a impossibilidade sobrevinda do devedor, no Código de 1942; dito preceito se insere no Capitulo relativo ao “cumprimento das obrigações” junto a norma sobre a obrigação de custodia (art. 1177), ao preceito que prescreve o dever que tem o devedor de coisas genéricas de entregar coisas de qualidade não inferior a media (art. 1178), e a todas a outras disposições que prescrevem diversas modalidades de cumprimento (art. 1179 e seguintes). Entretanto, a diferença do Código francês; já os autores italianos, com base no Código Civil revogado, ainda adaptando a doutrina francesa, superaram-na ao formular o modelo de diligencia do “bom pai de família” como critério regulador do cumprimento de qualquer obrigação, e não só como exigência nas obrigações de “vigiar a conservação da coisa”. Ademais, outras inovações não meramente sistemáticas foram introduzidas no artigo 1176 a respeito de seu precedente no Código Civil de 1865, norma que, de outra parte, havia sido qualificada como uma “das mais problemáticas da codificação de 1942”. 

Assim, de um lado, o artigo 1176 suprimiu o duplo reenvio que continha no último inciso do primeiro parágrafo e o segundo parágrafo do artigo 1224 às diversas regras previstas para o depósito e naqueles casos em que a diligencia devia valorar-se com maior ou menor rigor[14]. De outro lado, introduziu como importante inovação o segundo parágrafo do artigo 1176 do CC, no qual se contempla a diligencia que se deve empregar no cumprimento de uma atividade profissional que vem mensurada em atenção à natureza da atividade em si.

 

II.b.5. – A diligencia como critério objetivo e geral no artigo 1176 do CC Italiano

 

Varias são as questões que suscitam os autores, da leitura que se faz do artigo 1176 do CC Italiano, fazendo radicar, principalmente, na determinação do significado (subjetivo ou objetivo) que cabe atribuir a diligencia e ao modelo do bom pai de família em tal artigo, e na individualização das funções desempenhadas pela diligencia. Esta última questão surge, não tanto pelo teor literal do referido artigo, como pela sua coordenação com o artigo 1218 que, em sede de inadimplemento das obrigações, consagra, sendo alguns autores, no Direito civil italiano um sistema de responsabilidade contratual objetiva.

 

 

III. – A diligência do bom profissional. A perícia como medida do cumprimento exato da prestação profissional

 

Uma vez expostos àqueles modelos de conduta que representam o nível de diligencia que se estima adequado para o exato cumprimento de uma obrigação de fazer, resta verificar um último modelo de diligencia exigível aos profissionais liberais e, entre eles, destacamos apenas como exemplo o advogado ou o médico, na busca dos parâmetros (objetivos e subjetivos) para determinar o comportamento que se considera exigível e esperado de um sujeito qualificado pelas condições por ele reunidas quando do desempenho de uma prestação que possui também certa qualificação ou que exige essa diligencia ou uma qualificação especial. Ademais, constitui um trabalho árduo ao enfrentar o estudo do modelo do artífice ou do profissional, realizar uma análise, de uma noção que avoca explicitamente ao âmbito das relações obrigatórias profissionais, isto é, a perícia que se exige no desempenho, bem como as conseqüências a este conectada.

 

 

III.1. – Evolução da noção de perícia. Do “artifex” ao profissional. A máxima “imperitia culpae adnumeratur”

 

III.1.a. – No Direito Romano clássico e pós-clássico

 

Suscitada a questão da relação existente entre a diligencia e a perícia; forçoso é fazer notar, como apontamos alhures, já no Direito Romano, durante a época de Justiniano, os compiladores já se ocupavam da mesma, ou mais propriamente da relação entre culpa e imperícia. Com efeito, a vinculação da noção de perícia à culpa, resulta do texto do Digesto 19.2.9.5:

 

Celsus etiam imperitiam culpae adnumerandum libro octavo digestorum scribit: si quis vitulos pascendos vel sarciendum quid poliendumve conduxit, culpam eum praestare debere et quod imperita peccavit, culpam esse quippe ut artifex, inquit, conduxit[15],

 

que foi repruduzido parcialmente no Digesto 50.17.132 e nas Institutas, Iust. 4.3.7, consagrando, deste modo o princípio imperitia culpae adnumeratur[16].

Assim, se destacam como significativos os exemplos infirmados pelo Digesto 9.2.8.1:

 

Idem dicitur et si propter infirmitatem sustinere mularum non potuerit: nec videtur iniquum, si infirmita culpae adnumeratur, cun affectare quisque non debeat, in quo vel intellegit vel intellegere debet infirmitatem suam alii periculosam futuram[17].

 

Também no Digesto 9.2.27.29 (Ulpiano. 18 ad. Ed.):

Si calicem faciendum dedisti, si quidem imperita fregit, damni iniuria tenebitur, si vero non imperitia fregit, sed rimas habebat vitiosas, potest esse excusatus: et ideoplerumque artífices convenire solent, cum eiusmodi dantur, non periculo suo se facere, quae res ex locato tollit actionem et Aquliae[18].

 

Enfim, muitos exemplos encontrados no Digesto poderiam ser referidos; entretanto, a partir da máxima consagrada na passagem 19.2.9.5 antes referidas, a imperícia se concebe, pela maioria da doutrina romanística, como um critério de responsabilidade tipicamente aplicável ao artífice; afirmação esta que implica traçar de maneira prévia, o que deve entender por “artifex”, isto é, que sujeitos podem incorrer na imperícia e, de outra, qual é a relação entre esta noção e a de culpa, é dizer de outra forma, se ambas aludem a  conceitos logicamente distintos, ainda que subsumindo a imperícia no conceito mais geral de culpa, ou se pelo contrário, como se depreende do fragmento antes referido, se tratam de conceitos idênticos que convém serem fundidos para os efeitos próprios.

Com respeito à primeira questão se pode observar que com a expressão “artifex” está se fazendo referência nos textos de Justiniano, ao expert, ao profissional que em sua arte ou oficio se dedica com habitualidade como são os exemplos do muleiro, do pastor, do alfaiate, etc. Entretanto, dos mesmos textos parece sobressair que não é imprescindível que o trabalho ou serviço desempenhado, ou a obra executada por tais pessoas exijam uma preparação e uns conhecimentos excessivamente técnicos e especializados.

Por tanto, se bem que a perícia se tenha ido evolucionando até chegar no modelo ou esquema de conduta aplicável a aquele a quem se presume sempre na posse de determinados conhecimentos científicos ou técnicos, de modo paralelo aquele referido pela noção da expressão “artifex” até poder-se-ia identificar com a figura extrema do profissional que possui uma bagagem de conhecimentos próprios de sua especialização, em troca, no Direito Romano clássico  e pós-clássico, o “artifex” vem caracterizado pelo sujeito que detém uma certa habilidade, que talvez, não requeira um conhecimento muito superior, como é o caso do referido muleiro, do qual faz sua profissão habitual, isto é, seu modo de vida.

Assim, “artifex” é, antes de tudo, no Direito Romano, o artesão que, com os conhecimentos típicos de seu oficio, já que não havia especializações neste sentido, se compromete a executar uma obra, servindo-se para este fim, da figura da “locatio conductio operis”, em quanto que a arte de marcenaria, tal como resulta do Digesto 19.2.13.5, e do Digesto 19.2.25.7, de tal maneira que se o “artifex” executa defeituosamente a prestação incorrendo em imperícia, se concede ao que encarregou da execução da mesma uma “actio locati”. Tais efeitos equiparam-se aos artífices, no sentido em que podem incorrer em imperícia, aqueles sujeitos que se dedicam ao exercício das artes liberais e que, em principio articulam suas prestações, durante uma primeira etapa, através do mandato, com independência de que medeiem ou posteriormente honorários.

Em conseqüência, seguindo tal interpretação, estes textos poriam de manifesto que a imperícia fica referida a um “fazer incorreto” ou “inadequado” enquanto que o “não fazer” aquele que deveria fazer não é tanto se tratar de imperícia como de culpa. Isto equivale dizer, não estar se referindo a execução da prestação técnica e sim aos posteriores cuidados. De outro lado, paulatinamente a noção de “artifex” se vai ampliando a ponto de predicar tal condição a qualquer sujeito que exerce seu conhecimento ou saber, próprios de uma determinada atividade que requer o domínio de certas regras de conduta, dedicando-se de maneira habitual e não esporádica a mesma, assumindo nesta atividade o caráter de profissão[19]. Tal atividade implica necessariamente na referencia a uma profissão, a um âmbito delimitado pelo conhecimento de certos usos ou regras que a dotam de atividade própria.

Em tal acepção, a noção de artífice vai se fazendo sinônima da noção de “profissional” e, em conseqüência, o parâmetro de comportamento aplicável resulta igualmente predicável, em geral, de todo profissional como, por exemplo, o “jurisperitus”, o “medicus”, o “mensor”, etc[20], o qual põe de relevo que tal cânon de conduta ou de diligencia “especializada” não é exigível ao “bonus pater familias”, ao não ficar compreendido no “quantum diligentiae” deve prestar. Por outra parte, do mesmo modo que sucedia com relação ao modelo de diligencia não profissional do bom pai de família, a idéia de graduação da perícia do artífice que resultava de algum texto do Corpus[21] foi recolhida e desenvolvida pela doutrina dos glosadores e dos pós-glosadores. Entretanto, a doutrina posterior deixou de referir-se explicitamente a graduação do modelo do experto, de tal modo que o modelo de conduta próprio do artífice, de maneira similar ao ocorrido com a diligencia do bom pai de família, ficou referido a aquele grau de valorativo, e não meramente estatístico, do profissional que aplica cuidadosamente os seus conhecimentos adquiridos conforme a sua “lex artis”.

Em suma, dos textos referidos que pertencem à compilação de Justiniano, pode-se depreender que as noções de “imperitia” e de “ignorantia” fazem referencia a aqueles elementos relativos a capacidade e a competência do sujeito, muito mais que uma simples disposição por sua parte de bem realizar a um bom fazer. Deste modo, se constata que quando o sujeito que se encontra obrigado a um “facere”, em que consiste a prestação, assume-a na condição de experto no âmbito em que aquela se desenvolve e, ao mesmo tempo, o cumprimento exato da prestação exige a posse de certos conhecimentos e a aplicação de técnicas de maior ou menor dificuldade ou especialização; deixam os textos de Justiniano, assim, de se referir ao “bonus” ou “diligens pater familias” como modelo de diligencia juridicamente exigíveis no cumprimento da obrigação que vem caracterizada precisamente por não ser um modelo profissionalizado ou qualificado.

 

III.1.b. – No antigo Direito de las Siete Partidas da Espanha

 

Com base neste Direito histórico, cabe ressaltar que esta lei já acolhia uma noção de culpa profissional ou de perícia, distinta a da culpa em sentido amplo, ao prever que aquele sujeito ao que se encomenda uma prestação de fazer em virtude de seus conhecimentos e saber, pode ficar obrigados a ressarcir os danos causados na execução daquela obrigação «por no ser sabidor de lo fazer, o por outra culpa». Esta diferença da imperícia respeito à culpa genérica parece ser deduzida do disposto na partida V, Título VIII, Lei 10:

 

«Quierense los omes a las vegadas mostrar sabidores, de cosas, que non son, de manera que se siguen daños a los que non conoscenm e los creen: e por ende dezimos, que si algun orebze, resciben piedra preciosa de alguno para engastonarla en sortija, o en  otra cosa por precio cierto: e la quebrantase engastonandola, por no ser sabidor de lo fazer, o por outra su culpa, que deve pechar la estimación  della a bien vista de omes Buenos e conoscedores destas cosas. Pero si el pudiere mostrar ciertamente que no  avino por su culpa e que era sabidor de aquel menester, segun lo eran los demas omes que usan del comunalmete e que el dano de la piedra, acaescio por alguna tacha, que auia enella: assi como alguna pelo, o alguna señal de quebradura que era en la piedra: entonce, no seria tenudo de la pechar. Fueras ende si quendo la rescibio, para engastonar, fizo tal pleyto co el señor della, q como quier que acaeciese,si la piedra se quebrantasse, q el fuesse tenudo de la pechar. E esto que diximos de los orebzes, se entiende también de los otros maestros, e de los físicos, de los cirujanos, e de los albeytares e de todos los otros que resciben precio para fazer alguna obra: o melenizar alguna cosa, si errasen em ella por su culpa o por mengua de saber»[22].

 

Assim, com esta última expressão se observa que frente a um cumprimento defeituoso da prestação a que se havia obrigado um artífice, a imputação pode-se dever a própria imperícia por não ter conhecimentos e habilidades próprias da profissão a que pertence ou consistir em não empregar os cuidados exigidos pela natureza da prestação ou por qualquer outra modalidade de culpa. Ademais, é preciso ter em conta que esta lei de Partidas, ao estabelecer a obrigação de reparar o dano, se refere especificamente a aqueles sujeitos que desempenham uma profissão, arte ou oficio como o ourives, o maestro ou o cirurgião. Portanto, o exercício de uma profissão ou de um oficio constituem precisamente o motivo para contratar com os mesmos, uma determinada prestação que exige o conhecimento da “lex artis” correspondente. Trata-se de uma relação de prestação de serviços baseada na confiança criada por um sujeito que pertence à profissão, ao que se poderá agregar o caráter “intuitus personae”.

Levando em conta o que se expôs até agora na eleição do modelo de conduta aplicável a uma relação particular obrigatória, ou de um bom pai de família, ou a de um expert, artífice ou profissional, devemos atender a qualidade objetiva da prestação, se esta é qualificada ou não. Isto é, haverá de levar-se em conta se sua execução requer uma determinada capacidade ou conhecimentos técnicos daquele que presta e de maneira relevante à condição ou posição assumida pelo devedor para poder cumprir, tomando em consideração suas qualidades profissionais em razão de sua atividade que constitui objeto da obrigação. Assim, a consideração da prestação qualificada implica na concorrência da mesma, de uma serie de dados objetivos que convertem sua realização inacessível para a grande parte dos homens comuns. Isto equivale dizer que o cumprimento e a execução do programa obrigacional não é acessível à aqueles que não possuem certos conhecimentos técnicos ou a experiência  necessária para o perfeito desempenho daquela.

Logo, a natureza da obrigação advém, neste aspecto, em critério de virtude do qual determina o modelo de conduta exigível para a satisfação do interesse creditício concreto, isto é, da natureza da obrigação se infere a imposição do modelo de conduta profissional. Junto a isso como pressuposto para a aplicação do modelo de perícia, devemos atender a condição em cuja virtude o devedor que presume possuir aqueles requisitos ou conhecimentos necessários para o cumprimento da prestação ao qual esta comprometida, sempre que pertençam à esfera da atividade a que se dedica habitualmente ou daquela que faz sua profissão ou oficio que possui ou se diz possuir, vinculadas, por exemplo, a publicidade ou propaganda em torno de sua atividade.

Para tanto, em situação de exigir um canon  de conduta especializado ou um determinado grau de perícia daquele que não é participe; o modelo do bom pai de família, o devedor deverá ostentar a condição de profissional no seio da atividade que constitui o objeto principal da obrigação assumida e cujo exercício constitui pressuposto indispensável para a consecução do interesse prometido. A condição de profissional liberal requer a intelectualidade da atividade a ser desempenhada frente aquelas atividades manuais e a autonomia ou a discricionariedade técnica que ostenta na execução das prestações que lhe são próprias. Em qualquer caso, ocasionando a possível violação de direito de terceiros ou inadimplemento da obrigação que se lhe imputa ou a que estava adstrito a cumprir, poderá ser buscado em caso de responsabilidade civil, inclusive do próprio órgão de classe que avalia ou atesta as condições técnicas do individuo, e no caso, a alegada imperícia se imputará a este, pois foi este quem acreditou o referido profissional ou atestou a sua qualificação, tornando-o apto ao mercado e ao exercício da profissão em pauta.

 

 

Referencias Bibliograficas

 

BADOSA COLLI., F.: La diligencia y la culpa del deudor en las obligaciones civiles, Bolonia, 1987.

 

BÁRTOLO DE SASSOFERRATO: Repetitio in lege quod Nerva, Quaest. 5ª.

 

GIORGIANNI, N.: Voz, Buon padre di famiglia, Novissimo Digesto italiano, II, Turín, 1958, pp. 596.

 

JORDANO FRAGA, F.: La responsabilidad contractual. Madrid, 1987.

 

IDEM, Las reglas generales de la responsabilidade contractual del Código Civil, Anuario de Derecho Civil, 38, 1985, fasc. 2, pp. 275 ss.

 

JORDAN DE ASSOY Y DEL RIO, I y M. DE MANUEL Y RODRIGUEZ: Instituciones del Derecho civil de Castilla, Madrid, 1792.

 

ROBERTIS, F. M. de: La responsabilità contrattuale nel sistema della grande Compilazione, vol I, Bari, 1983.

 

TALAMANCA, M. “Colpa Civile”(storia), Enciclopédia Del Diritto, vol. VII. Milan, 1990.

 

VISINTINI, G. [dir.], Trattato della responsabilità contrattuale. Vol. I: Inadempimento e rimedi, CEDAM, 2009.

 

 

Resumen

 

Los Códigos anclados en la tradición romanista se han revelado insuficientes en el tráfico de bienes masificados para tutelar al adquiriente-contratante, objetivo final de un ciclo de producción elaborado y acosado por los múltiples reclamos. De ahí que la protección del adquiriente-contratante se haya convertido en una exigencia no sólo jurídica, sino tambien social, de clase, condicionada por la debilidad en que se encuentra en el mercado. En este contexto, la buena fe, mas que un principio jurídico, y como tal es un principio rector, afigurase necesariamente como una regla de conexión en la tutela del contratante débil. En el derecho romano el concepto bona fides se utilizó de modo conexo con el desarrollo del comercio internacional. El termino fides se encuentra en el derecho romano y se podria decir que es el sinónimo del termino actual de la buena fe. La fides se encontraba entonces en tres sectores: a) en las relaciones con la clientela, b) en los negocios contractuales y, c) en la protección posesoria. En ese orden de cosas, la fides era el desarrollo de la fidelidad estricta de la palabra dada, es decir pacta sunt servanda en el cual no se admitía incertidumbre en el contenido de la obligación y por outro lado, la fidelidad de lo substancial, que se subordina a la apreciación del contenido de equidad y de buena fe. Para obrar de buena fe, las buenas intenciones y la crencia de que se está actuando correctamente no son  suficientes, sino que es menester la realización de una conducta positiva que suponga un esfuerzo para lograr el esclarecimiento y certidumbre de la naturaleza autentica de los hechos y de los actos. El principio de la buena fe, es de suma importancia , y en general, puede decirse que, de alguna manera, en todas las instituciones jurídicas subyace este principio, de allí el que se refleje en todas las aristas del ordenamiento jurídico, en especial en la conducta en el cumplimiento de una obligación.

 

Palabras clave: derecho romano, protección del adquiriente-contratante, equidad, bona fides, obligaciones.

 

 



 

[Per la pubblicazione degli articoli della sezione “Tradizione Romana” si è applicato, in maniera rigorosa, il procedimento di peer review. Ogni articolo è stato valutato positivamente da due referees, che hanno operato con il sistema del double-blind]

 

* Professor Adjunto de Direito Romano da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pelotas/Brasil. Doutora em Direito pela Universidad de Jaén,/Espanha (Programa de Doctorado Cuestiones Fundamentales de Derecho Público del Departamento de Derecho Eclesiástico, Internacional Público, Procesal y Romano). Secretária Geral da URBS - União dos Romanistas Brasileiros.

 

* Professor Associado de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pelotas/Brasil, Master Experto Universitário em Direito do Consumo e Orientação ao Consumidor pela Universidade de Granada/Espanha e a Junta de Andaluzia, Doctor Juris pela Universidade de Granada/Espanha e Advogado.

 

[1] Assim, v.g. para o sócio (Digesto 17.2.72); para o tutor a respeito da administração dos bens pupilares (Digesto 26.7.33.pr. E Digesto 27.3.1.pr.); para o co-herdeiro em relação com os bens hereditários (Digesto 10.2.25.16) e, excepcionalmente, para o marido a respeito dos bens integrantes do dote (Digesto 23.3.17.pr. e Digesto 24.3.24.5) nos quais se prescrevia que a omissão do emprego de tal diligencia quam in suis determinava uma culpa “levis” (en la societas), bem uma “levíssima” (na dote). As várias referencias a este modelo de diligencia “quam in suis” também se observa no Digesto 7.9.1.3: Mas deve dar caução de que aproveitará do usufruto segundo o arbítrio de um homem reto, isto é, que não prejudicará a condição da coisa dada em usufruto, e que se comportará por outra parte, como faria com suas próprias coisas; e também no Digesto 10.2.25.16: Nec tamen diligentiam praestare debet qualem diligens pater famílias...talem igitur qualem in suis rebus (não devendo prestar a diligencia de um bom pai de família, ...sim a mesma que prestaria em suas próprias coisas). TALAMANCA, M.:Voz Colpa Civile” (storia), Enciclopedia del Diritto, vol. VII. Milan, 1990, 521 e 523, a diligencia quam in suis já é conhecida pelos clássicos, equiparando-a, em certas ocasiões, a culpa lata e aproximando-a a responsabilidade por dolo.

 

[2] BADOSA COLLI., F.: La diligencia y la culpa del deudor en las obligaciones civiles, Bolonia, 1987, 136.

 

[3] Para tanto, a diligencia referida se constitui no parâmetro com o qual se valora a conformidade do comportamento habitual do devedor, devido a aquele tido em concreto pelo devedor no cumprimento da obrigação contraída. Por ele segue o Direito Justinianeo, que incorre em culpa in concreto ao haver um desvio in peius do próprio comportamento habitual.

 

[4] GIORGIANNI, N.: Voz, Buon padre di famiglia, Novíssimo Digesto italiano, II, Turín, 1958, 596 ss. No mesmo sentido JORDANO FRAGA, F.: La responsabilidad contractual, Madrid, 1987, 133; ID., Las reglas generales de la responsabilidad contractual en el sistema del Código civil español, Anuario de derecho civil, 38, 1985, fasc. 2, 314 e 315.

 

[5] DI MAJO, A.: Dell’adempimento in generale, Commentario del Codice Civile Scialoja-Branca. Bologna-Roma, 1988, 409 ss., a noção de diligencia historicamente esteve relacionada aos deveres sociais de gestão, de gozo e de administração das coisas alheias, correlativamente também nas obrigações de restituição destas coisas.

 

[6] Conforme DE ROBERTIS, F.M.: La responsabilità contrattuale nel sistema della grande Compilazione, vol I, Bari, 1983, 185 ss.

 

[7] O critério da utilitas partium contrahentium assumia uma considerável relevância no âmbito contratual quando se tratava de estabelecer se em certas relações obrigatória uma das partes só ficava vinculada a prestar a diligência mínima no cumprimento de sua obrigação quando esta não obtinha utilidade alguma do contrato como, por exemplo, no depósito.

 

[8] Isto provocará a variedade das expressões que os comentaristas bizantinos vão outorgando ao termo culpa e, em conseqüência, a exigência de aclarar e precisar em cada situação, qual será a mais apropriada à hipótese concreta.

 

[9] Assim expõe BADOSA COLLI, F.: La diligencia y la culpa del deudor en la obligación civil, cit., 87 e 88, que o conceito de “pai de família” é equivalente ao não profissional, ou não experto ou àquele possuidor de conhecimentos de conhecimentos especializados. Entretanto, aponta acertadamente este autor, que a excusabilidade da ignorância do pai de família não pode ser absoluta, já que deve possuir certos conhecimentos “los inherentes a ninguna profesión, aquellos que pueden definirse como estando al alcance de cualquiera o conocimiento del funcionamiento habitual  de los fenômenos corrientes de la vida”. Desta afirmação faz derivar duas conclusões: pode se constituir em um modelo predicável de todos os sujeitos sem distinção e sua infração é inescusável.

 

[10] BÁRTOLO DE SASSOFERRATO: Repetitio in lege quod Nerva, Quaest. 5ª e 7ª, elabora uma construção deste modelo de conduta como único ao definir os três graus de culpa como referencia ao mesmo.

 

[11] Entre estas se destaca o comodato, o mandato, a “negotiorum gestio” e o legado.

 

[12] Artigo 1001 do Código Civil da Sicília assim como o artigo 1228 do Código Civil Sardo, precedentes do Código Civil Italiano de 1865, contém idênticas formulações ao do artigo 11137 do Code.

 

[13] L’obligation de donner des soins consciencieux, attentifs, et reserve faite de circonstances exceptionnelles, conformes aux données acquises de la science, conforme RECUEIL DALLOZ, 1936, I, 88, com notas de JOSSERAND.

 

[14] VISINTINI, G. [dir.]: Trattato della responsabilità contrattuale. Vol. I: Inadempimento e rimedi, CEDAM, 2009, 120 e 121, se refere que a eliminação de ditas remissões se deve ao abandono do critério da diligencia “quam in suis” no deposito (que previa o artigo 1843 do CC de 1865 e que não era recebida pelo artigo 1768  do CC vigente) e a intenção dos redatores do CCI que consideravam supérflua esta remissão, devendo, ter por certo, que subsistem também no novo sistema, casos em que dita diligencia deve ser apreciada com maior ou menor rigor.

 

[15] Escreveu Celso que a imperícia deve ser tomada como culpa.

 

[16] No titulo dedicado a Lex Aquilia, se diz: Também a imperícia se considera culpa. É o caso do médico que não operou bem a um escravo, ou receitou mal, originando com isso sua morte.

 

[17] «Assim mesmo quando um muleiro havia sido incapaz de deter por imperícia o ímpeto das mulas, se houvesse atropelado a um escravo alheio, se diz comumente que responde por culpa. Diz-se também o mesmo, se não pudesse reter o ímpeto das mulas por debilidade, e não parece injusto que a debilidade se equipare a culpa, desde o momento em que ninguém deve assumir um trabalho  em que sabe ser sua debilidade perigosa para os outros».

 

[18] «Se destes uma taça para talhar nela um engaste, ficará obrigado pelo dano injusto que rompeu este cristal por imperícia. Mas se não rompeu por imperícia porque havia rachaduras defeituosas, pode se escusar o devedor, razão porque, costumam convir muitas vezes os artífices, ao ser-lhes dado material defeituoso, podendo rejeitá-los, elidindo assim a ação Aquiliana».

 

[19] Para BADOSA COLLI, F.: La diligencia y la culpa del deudor..., cit., 123, não cai dentro do conceito de artífice «aquele fazer que se apóia em uma mera habilidade pessoal» fundada em qualidades pessoais e intrínsecas ao sujeito e como tais irrepetíveis. O artífice deverá possuir uns conhecimentos que são suscetíveis de serem aprendidos.

 

[20] Esta vinculação é defendida por BADOSA COLLI, F.: op. cit., 125 ss.

 

[21] Digesto 46.3.31 “Inter artifices longa diferentia est ingenii et naturae et doctrinae et institutionis...”.

 

[22] JORDAN DE ASSOY Y DEL RIO, I y M. DE MANUEL Y RODRIGUEZ: Instituciones del Derecho civil de Castilla, Madrid, 1792, 242 ss.